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Que tal um algoritmo com assento no STF?

Com retorno duvidoso para o pagador de impostos, o sistema judiciário brasileiro poderia ganhar eficiência com o uso da Inteligência Artificial

stf - vergonha mundial

STF é “vergonha mundial”, dizem internautas | Foto: Reprodução/Twitter

De uns tempos para cá, as sessões do Supremo Tribunal Federal, o STF, passaram a atrair interesse comparável ao das novelas de televisão e partidas de futebol, o que não deixa de ser uma boa notícia. Boa parte dos brasileiros, tradicionalmente alheios às questões públicas, hoje sabe elencar os nomes dos onze componentes da mais alta corte. E até discute nas redes sociais a moralidade de cada um deles, em função de seus currículos e votos. Mesmo sabendo que críticas a suas excelências pode valer uma ordem de prisão.

Como certos ministros posam de paladinos da justiça nas sessões televisionadas, embora ajam muitas vezes como vilões, as torcidas se dividiram entre “garantistas” e “lava-jatistas”. Os primeiros, que podem ser encontrados sobretudo no meio jornalístico e entre advogados com causas milionárias na defesa de corruptos, defendem que os juízes devem se restringir a aplicar estritamente o texto da lei. Não lhes cabe levar em conta as consequências práticas de seus atos, o contexto das decisões e muito menos demandas e pressões da sociedade.

Do outro lado da arquibancada, quem não quer ver criminosos à solta — sejam homicidas, estupradores, traficantes, ou ladrões do dinheiro público — passou a ser identificado com o nome da megaoperação anticorrupção iniciada em Curitiba. Aquela que, como num roteiro de thriller político-policial, vem tentando sobreviver a uma poderosa articulação de forças contrárias com o objetivo de reduzir a roubalheira no país.

Foi assim mais uma vez nos últimos dias, diante da liberação pelo ministro Marco Aurélio Mello do criminoso André Macedo, vulgo “do Rap”, notório narcotraficante e líder de uma quadrilha de facínoras com ramificações internacionais, o Primeiro Comando da Capital, PCC. Vale lembrar que o sujeito, que escapuliu de imediato para o exterior, como se o seu jatinho estivesse aguardando na pista a emissão do habeas corpus, havia sido encarcerado após duas condenações em outros tribunais.

Não é difícil prever qual seria o seu encaminhamento deste caso em qualquer país regido pelo império da lei e da igualdade de todos perante a Justiça. Mas não interessa aqui discutir as tecnicalidades em disputa. Até porque a imprensa e os próprios juízes do STF — alguns dos quais, ressalve-se, nunca foram juízes antes da nomeação para a Corte — já abordaram estas questões exaustivamente.

O que talvez valha acrescentar à polêmica é o ponto de vista, quase sempre ignorado, de quem bancou este espetáculo lamentável. O interesse do pagador de impostos que sustenta a imensa estrutura policial e jurídica do país em troca, supostamente, da garantia de seu direito constitucional à vida e à segurança. Já se sabe que nosso Judiciário é o mais caro do mundo — segundo estudo de 2014, antes portanto dos incrementos e ajustes salariais dos últimos anos, ele já abocanhava 1,2% do PIB, muito acima da média das nações desenvolvidas. Relatório de 2019 do Conselho Nacional de Justiça indicou que a média salarial dos juízes brasileiros é R$ 50,9 mil por mês, cifra que cresceu 8,7% em um ano e não inclui gastos com remuneração, indenizações, encargos sociais, previdenciários, Imposto de Renda e despesas com viagens.

Como é flagrante que este mastodonte não devolve a contrapartida que dele se espera em serviços, tendo em vista que o Brasil permanece como recordista de crimes e símbolo internacional de impunidade, fica claro que a relação custo-benefício do investimento no sistema mostra-se negativa.

A avaliação piora quando se considera especificamente o preço pago pelos serviços do STF. Só no ano passado, a Corte custou aos brasileiros R$ 698,9 milhões. O que representa R$ 58,2 milhões por mês, em cálculo feito por esta revista OESTE em matéria de julho passado. Ou R$ 1,94 milhão por dia. A remuneração que pagamos a cada ministro também não é desprezível se comparada à da média dos profissionais do setor privado — embora ganhem oficialmente o valor do teto do funcionalismo,  R$ 39.293,32  mensais, seus contracheques são turbinados por uma série de benefícios pouco divulgados, incluindo um certo  “abono de permanência”  de R$ 6.562,81 pagos aos  veteranos.

Parece válido, portanto, especular quanto terá custado aos cofres públicos o conjunto de ações, recursos e julgamentos que envolveu os processos do criminoso em questão. Deve-se ainda acrescentar ao total as horas de trabalho dos policiais e delegados que labutaram para colocar na cadeia um bandido de tal estatura, considerando-se as conexões privilegiadas que este tipo de criminoso costuma adquirir nas várias instâncias do poder.

A pergunta é se este investimento se justifica caso o papel do juiz encarregado de decidir sobre a soltura do réu for unicamente mandar aplicar a lei conforme leitura literal do texto, como quem aperta um botão. Se a resposta for positiva, o recurso à Inteligência Artificial, com o perdão do sarcasmo, poderia ser uma alternativa. Já existe consenso de que o desempenho de robôs e algoritmos é superior ao do cérebro humano quando se trata de tomar decisões que não envolvem discernimento, apenas a análise de grande quantidade de dados e informações.

A utilização de IA, aliás, vem crescendo em escritórios de advocacia pelo mundo afora, já que a tecnologia permite esquadrinhar os calhamaços de leis, decisões e jurisprudências necessários à boa instrução de um processo em menos tempo e com menor probabilidade de falhas do que quando a tarefa é entregue a advogados. Na medicina, da mesma forma, confia-se cada vez mais a robôs os procedimentos cirúrgicos que demandam alta precisão e baixa tolerância a riscos.

Já há notícia até mesmo de algoritmos que participam do conselho administrativo de empresas de capital aberto. Um deles, contratado pela Deep Knowledge Ventures, uma companhia de capital de risco de Hong Kong, chama-se Vital e tem direito a voto nas decisões.  No futuro, segundo  projeções de especialistas, seus pares cibernéticos acabarão por substituir a maioria dos profissionais que não agregam inteligência ao que fazem. Fica a dica.

Leia mais sobre o assunto na matéria “A vida com os algoritmos”, publicada na edição 29 da Revista Oeste

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