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Testes de Covid voltam a cair em outubro; especialistas alertam que exames são essenciais para rastrear e frear avanço da pandemia – G1

O total de testes moleculares (RT-PCR) para diagnóstico da Covid-19 realizados no Brasil voltou a cair em outubro (veja média diária no gráfico acima). Foi o segundo mês seguido de queda, de acordo com dados compilados pelo Ministério da Saúde.

A queda no tipo de testes mais indicado para identificar pacientes com infecções recentes é vista com preocupação pelos especialistas. Os pesquisadores defendem que o Brasil deveria estar no caminho inverso: ampliando os testes para rastrear e frear o avanço da pandemia.

Isso porque, depois de meses de pandemia, já é sabido que o coronavírus é transmitido principalmente entre contatos próximos e logo nos primeiros dias após o aparecimento dos sintomas de Covid-19.

O rastreamento de contatos nada mais é do que identificar e acompanhar as pessoas que foram expostas à doença (leia mais abaixo). Ele já foi adotado para controlar a propagação de outras doenças infecciosas.

A falta de isolamento dos infectados causa surtos que podem ser controlados pela implementação de medidas direcionadas. A orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é encontrar os casos, isolar, testar e rastrear.

“Para rastrear um contato, você precisa do diagnóstico da pessoa. Quanto mais tivermos disponível o teste RT-PCR, mais vamos rastrear os casos secundários. Se ficarmos na ignorância de dados, não teremos sucesso. Precisamos detectar pessoas com ou sem sintomas do coronavírus”, alerta a infectologista Rosana Richtmann.

Segundo ela, além do teste, é importante saber três coisas com relação à transmissão: há quanto tempo a pessoa foi exposta ao vírus, em que ambiente ocorreu essa exposição e se houve ou não distanciamento. “Com essas três coisas já conseguimos fazer o rastreamento”, diz.

O físico Vitor Mori, pós-doutorando na Faculdade de Medicina da Universidade de Vermont (EUA) e membro do Observatório Covid-19 BR diz:

“Todo mundo fala da importância do rastreamento, mas não é simples. Precisa de estrutura. Talvez o grande desafio é a testagem. Detectar o vírus na pessoa é importante. Se não fizermos, não sabemos quem está infeccioso. Acabamos baseando o rastreamento só nos sintomas, mas existem os assintomáticos”.

Testes em baixa

Os dados do Ministério da Saúde apontam que o Brasil fez menos testes do tipo RT-PCR em setembro e em outubro do que nos meses anteriores. A pasta divulgou dados absolutos dos testes realizados ao longo do ano até setembro. Em comparação com agosto, a queda foi de 11,5% – uma diminuição de 122.944 testes.

Entretanto, os dados completos não foram divulgados para outubro nos mesmos moldes. A queda só foi verificada porque a média diária foi divulgada: foram 31.492 testes por dia em setembro, contra 28.664 em outubro.

Os testes do tipo RT-PCR, também conhecidos como testes moleculares, são aqueles que detectam o genoma do vírus (o RNA viral) na amostra – ele é considerado o padrão-ouro e serve para o diagnóstico de fato, porque, se o genoma do vírus é encontrado na amostra, a pessoa está infectada.

“É possível trabalhar o conjunto de sintomas, sem o teste [para rastrear]. Mas isso é mais difícil, porque você não pega uma porcentagem de assintomáticos”, diz o físico Vitor Mori.

Outro tipo de teste, chamado de teste rápido, não é eficaz para o rastreamento. Isso porque ele serve para determinar se a pessoa já teve contato com o vírus no passado – e o rastreamento de contatos tem uma função anterior: colocar em quarentena quem está com o vírus ativo.

“Se a pessoa apresenta sintomas hoje, a ideia do rastreamento é isolar essa pessoa e todas com quem ela teve contatos nos últimos três dias. É conseguir ‘quarentenar’ a pessoa antes que ela entre na fase de infectar outras pessoas”, explica Mori.

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Rastreamento retrospectivo

“Reabrimos bares, cinemas, espaços públicos. Precisamos testar as pessoas e começar o rastreamento. Precisamos usar os EPIs. Se cada um puder fazer na sua área algum modelo de rastreamento, isso já seria muito bom”, analisa a médica Rosana Richtmann.

Para Mori, o Brasil precisa focar no rastreamento retrospectivo, ou seja, olhar para trás e descobrir em qual evento essa pessoa se infectou. Dessa forma, é possível detectar mais pessoas com Covid-19.

“Falamos muito do rastreamento prospectivo – uma vez que eu tenho a pessoa com sintomas, eu vou atrás dos contatos com quem ela teve contato.”

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Rastreamento de contatos é mais um importante aliado para mitigar a disseminação do novo coronavírus — Foto: Buffik/Pixabay

Rastreamento de contatos é mais um importante aliado para mitigar a disseminação do novo coronavírus — Foto: Buffik/Pixabay

Para a bióloga Camila Estevam, que integra uma iniciativa para divulgar experiências de rastreamento de contatos no Observatório Covid-19 BR, o ideal é ir para o maior nível de rastreamento possível.

“É difícil rastrear contatos em uma cidade grande como São Paulo. Então nós trabalhamos a nível de contato. A transmissão intradomiciliar é muito maior do que na rua – pessoas que trabalham junto, estudam junto. A população precisa entender também a sua responsabilidade e como fazer esse rastreamento”, diz ela.

Os esforços do Brasil para rastrear

Em abril, começo da pandemia no Brasil, o SindiTelebrasil, que representa as principais operadoras de telefonia do Brasil, informou que as empresas ofereceram ao governo os dados para monitoramento da movimentação dos clientes. Os dados poderiam ajudar no rastreamento de contatos.

Entretanto, sob a justificativa de que os riscos à privacidade precisavam ser mais bem avaliados, o presidente Jair Bolsonaro determinou que o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) interrompesse tratativa com operadoras de telefonia para uso dessas informações pelo governo federal.

Apesar da negativa do governo federal, muitos estados adotaram o rastreamento via aplicativo. O G1 entrou em contato com as secretarias de Saúde das dez capitais mais afetadas pela Covid-19 e todas disseram que fazem o rastreamento de contatos, seja por telefone, pessoalmente ou por aplicativos e que seguem o protocolo do Ministério da Saúde.

Em julho, o Ministério da Saúde anunciou uma nova funcionalidade para o aplicativo Coronavírus-SUS para alertar sobre a exposição a novos infectados pela doença. Com base em um tecnologia desenvolvida por Google e Apple, a plataforma avisa, pelo celular, em até 24 horas, sobre pessoas que testaram positivo para Covid-19 e estiveram próximas ao dono do aparelho nos últimos 14 dias. Segundo o ministério, o app já teve mais de 10 milhões de downloads.

O Ministério da Saúde disponibilizou um documento em agosto com orientações sobre o rastreamento e monitoramento de contatos de casos de Covid-19. O objetivo, segundo o órgão, é identificar as pessoas que estiveram em contato com um caso confirmado no período de transmissibilidade da doença.

Em setembro, a pasta liberou uma verba de R$ 369 milhões para estados e municípios (5.570 localidades) investirem no rastreamento de contatos. Segundo o documento, o valor é destinado a 61.618 profissionais da saúde. “O objetivo é qualificar o processo de notificação e investigação dos casos de Covid-19 e promover uma avaliação contínua da situação epidemiológica local. O impacto poderá ser medido a médio e longo prazo”, disse o Ministério da Saúde, em nota.

O que é o rastreamento de contatos?

“O rastreamento é contatar todos que tiveram contato com alguém que testou positivo e isolar antes que essa pessoa se torna infecciosa”, explica a bióloga Camila Estevam.

A pessoa que está com o vírus é identificada e isolada. Com base nessas informações, é possível interromper a propagação do vírus. Além disso, o rastreamento permite que o infectado se isole e que seus contatos também fiquem em quarentena.

“A ideia do rastreamento é quebrar essa cadeia [de contaminação]. Para fazer, precisamos usar a estrutura do SUS, os agentes comunitários. Quanto mais próximo da população, melhor”, explica a bióloga.

Vale ressaltar que o rastreamento de contatos é um mais uma medida e não substitui outras ações, como o uso de máscaras e o distanciamento social.

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Moradores se exercitam no parque Hagley em Christchurch, na Nova Zelândia, no domingo (9), quando o país completou 100 dias sem transmissão de coronavírus — Foto: Mark Baker/AP

Moradores se exercitam no parque Hagley em Christchurch, na Nova Zelândia, no domingo (9), quando o país completou 100 dias sem transmissão de coronavírus — Foto: Mark Baker/AP

Exemplos positivos

Quando aplicado de forma sistemática, o rastreamento de contatos pode interromper a cadeia de transmissão.

Um exemplo de sucesso é a Nova Zelândia. No começo de outubro, a primeira-ministra Jacinda Ardern anunciou o fim das restrições ordenadas em Auckland após 12 dias sem novos casos de Covid-19. Ela disse que o país “venceu novamente o vírus”.

Para tentar controlar a pandemia, o governo foi atrás dos casos e não esperou que eles chegassem até o hospital, investindo no rastreamento de contatos.

A maior parte do trabalho era feita por telefone. Quando alguém era diagnosticado com Covid-19, seus contatos mais próximos eram identificados e avisados diretamente. A orientação era que a pessoa se isolasse adequadamente para não propagar ainda mais o vírus.

Esse também foi o caminho da Coreia do Sul. O país tem uma das taxas de morte por Covid-19 mais baixas do mundo. No começo da pandemia, o governo criou uma rede para detectar o vírus no estágio inicial.

Além do rastreamento de contatos, Nova Zelândia e Coreia do Sul investiram na testagem da população. Isso permitiu que os países tivessem um panorama mais amplo sobre a disseminação do vírus.

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