sábado, abril 27Notícias Importantes
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Onde Encontrar Esperança e Ajuda em meio à Revolução Sexual

Não é segredo que o mundo ocidental passou por uma transformação dramática em relação a questões de sexualidade e identidade de gênero. Há vinte anos, a aceitação generalizada do casamento gay parecia em grande parte impensável. Mesmo há apenas 10 anos, as questões do transgenderismo estavam longe da consciência convencional. Muitos em nossa cultura viram estas mudanças como uma coisa irrestritamente boa, um sinal necessário de progresso em direção a uma sociedade mais justa e inclusiva.

Mas, para muitos cristãos, estas mudanças têm sido desconcertantes. O mundo que pensávamos que conhecíamos desapareceu à nossa frente. A visão cristã do casamento como sendo entre um homem e uma mulher, e a suposição básica de que todos somos criados como homens e mulheres, podem nem sempre terem sido defendidas por nossa cultura, mas eram pelo menos vistas como uma parte legítima (se pitoresca) do pensamento ocidental. Agora, tais visões são cada vez mais vistas como um perigo real para a sociedade.

Então, como chegamos até aqui, e o que devemos fazer a respeito?

Quero sugerir pelo menos quatro mudanças que explicam como nossa cultura chegou a este momento e, em seguida, propor sete maneiras como podemos responder.

Quatro Mudanças Culturais Significativas

1. Nossas intuições morais mudaram.

Em seu livro de referência A Mente Moralista, o psicólogo Jonathan Haidt mostra que nossas convicções morais tendem a surgir intuitivamente ao invés de racionalmente. Temos um sentimento intuitivo sobre o que é moralmente certo e errado—e as intuições que impulsionam esta reação instintiva mudaram na última década. Preferências morais específicas entraram em jogo: Será que um determinado curso de ação parece prejudicial ou não; libertador ou opressivo; justo ou discriminatório? Haidt argumenta que tais fatores primários determinam nossas conclusões morais.

Sendo assim, podemos entender como a cultura ocidental acolheu o casamento gay tão rapidamente. Aplicando a primeira das três preferências morais: É prejudicial a qualquer outra pessoa? Certamente, se o lindo casal gay nosso vizinho puder se casar, isto não vai me afetar de forma adversa. Segundo, proibir o casamento gay parece opressivo ao invés de libertador. Certamente todos tem o direito de amar quem quiserem e de expressar tal amor da maneira que quiserem. E, em terceiro lugar, parece profundamente injusto se opor a isto. Como pode ser justo ou honesto um tipo de casal poder se casar, mas outro nāo? Visto desta forma, apoiar o casamento gay parece intuitivamente certo. Não admira que muitos, que outrora se opunham, mudaram sua maneira de pensar nos últimos anos.

Além disso, podemos entender o porquê de que os argumentos cristãos contra o casamento gay parecem não ter ressonância: não levam em conta esta mudança de intuições morais. Muitos cristãos, sem se dar conta, apelam a um raciocínio moral que simplesmente não se conecta a uma pessoa secular típica. Lembro-me de assistir a um debate na TV sobre se as igrejas evangélicas deveriam permitir o casamento gay. A proponente de permitir, apresentou um argumento simples (e, para o público, convincente): “Deus é amor. Eu encontrei amor com outra mulher, e isso é algo que Deus quer abençoar e a igreja deve celebrar.”

Em resposta, um pastor evangélico ficou respondendo repetidamente: “Mas a Bíblia diz que o casamento é entre um homem e uma mulher”. Ele tem razão. No entanto, estava recorrendo a algo (a autoridade das Escrituras) ao qual a audiência nāo dava valor. (A resposta ao argumento “Deus é amor” é apontar que Deus ser amor não significa que ele aprova tudo o que pensamos ser amor. Significa que Deus sabe muito mais sobre o amor do que nós, e por isso necessitamos ouvi-lo se quisermos saber como ordenar nossos amores—e, assim, amar uns aos outros de forma adequada e boa.)

2. Nossa visão das minorias mudou.

As pessoas seculares hoje olham para a discriminação anterior contra pessoas LGBTQ+ e ficam abismadas. Hoje estamos cientes da dor causada pela homofobia passada e pela demonização da comunidade gay. Vemos filmes como O Jogo da Imitação e programas de TV como Transparent e somos movidos a ter compaixão pelas pessoas que nossa cultura antigamente vitimava abertamente. De muitas maneiras, nós, cristãos, podemos aplaudir esta mudança. Há amplas razões bíblicas para ficarmos chocados com bullying deste (ou de qualquer outro) tipo.

Este sentimento de vergonha social sobre discriminação passada levou ao fenômeno da interseccionalidade. Por causa do que aconteceu no passado, e de como certos grupos foram silenciados, hoje privilegiamos o status de minoria e vítima. E se alguém se encontra com mais de um status de minoria, sua voz tem credibilidade exponencial no debate público. Não se trata de um campo de jogo igual para todos— e isto é intencional. Se alguém for, digamos, negra, mulher e lésbica, sua voz conta mais do que alguém que é homem, branco e heterossexual.

Esta dinâmica também levou a uma grande preocupação com minorias serem prejudicadas emocional ou psicologicamente. Algum tempo atrás, fui convidado a falar sobre a sexualidade e o evangelho a um grupo cristão em um campus universitário secular, e o grupo de defesa LGBTQ+ do campus organizou um protesto. Encontrei-me com os manifestantes pouco antes do início da reunião, para ouvir as suas preocupações e ver se havia alguma garantia que eu poderia lhes dar. À medida que manifestavam suas preocupações com o evento, ficou claro que a preocupação mais significativa era que minhas palavras seriam prejudiciais a qualquer cristão gay que pudesse estar presente na reunião. Quando os questionei mais, descobri que pelo menos parte do que eles queriam dizer por dano era simplesmente a presença de uma opinião contrária, por mais graciosamente que fosse expressa.

Podemos ver, então, por que tanto do pensamento progressista é censurador, especialmente nos campi universitários. Se o ponto de vista de alguém vai causar danos, então não precisa ser validado ou debatido. Só precisa ser silenciado e cancelado.

3. Nossa visão de sexo e casamento mudou.

Isso ocorreu ao longo de um período de tempo mais longo do que os outros, remontando à revolução sexual dos anos 1960.

Primeiro, nossa visão do sexo mudou. Para muitos, foi desacoplado da procriação. É simplesmente um meio de recreação, e não precisa ser mais que isto. Isso serve de alguma maneira para explicar o porquê de apesar dos avanços na tecnologia de ultrassom e crescente compreensão da sensibilidade e desenvolvimento de um nascituro, o lobby pró-aborto é tão intenso. Em última análise, não se trata do status do feto; trata-se do direito de ter sexo recreativo sem consequências reprodutivas.

Em segundo lugar, nossa visão do casamento mudou—não apenas pelo fato de que muitos países ocidentais agora reconhecem legalmente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas também de uma maneira prévia e mais significativa. O casamento não é mais uma aliança permanente ordenada para a procriação. Agora é efetivamente um contrato romântico flexível; uma oportunidade para celebrar sentimentos românticos profundamente satisfatórios um pelo outro. E se esses sentimentos diminuírem—caso um parceiro não seja mais um meio de realização romântica para o outro—então um ou ambos ficam livres para dissolver o casamento. Tal visão do casamento obviamente não obriga que o casal seja heterossexual. Se o casamento se trata da celebração de sentimentos românticos, então parece profundamente injusto excluir do casamento, certos tipos de relacionamento.

4. Nossa antropologia mudou.

Hoje, o seu “eu” real é quem você sente ser em seu âmago. A narrativa de herói de nossos dias se trata da pessoa que vai fundo em sua procura, descobre quem é, e depois persiste em expressar aquilo que encontrou mesmo diante de oposição. Seu “eu” real é alguém que só você pode descobrir; ninguém mais pode determinar sua identidade.

Além disso, o corpo físico é inteiramente acidental. Na evolução ateísta, o corpo é simplesmente o pedaço de matéria à qual você está ligado. Não tem sentido ou significado intrínseco. De fato, a evolução nos mostra que qualquer coisa física pode literalmente se tornar qualquer outra coisa, portanto não há razão para que não possamos moldar nosso corpo físico em algo totalmente diferente daquilo que começou sendo. Se acidental, então segue-se que é incidental. O corpo é uma tela na qual posso expressar minha identidade, mas não determina de forma alguma minha identidade.

Estas quatro mudanças revelam algo de vital importância se quisermos trilhar nosso tempo cultural: a compreensão tradicional e cristã da ética sexual e da identidade de gênero não é apenas pitoresca e antiquada. É perigosa.

Precisamos ter em mente que as mudanças acima afetam não apenas a sociedade secular. Estão também profundamente arraigadas em muitas pessoas dentro de nossas igrejas. Para aqueles com menos de 25 anos, este é o oxigênio que respiram. É a única realidade que conhecem.

O resultado é que há muitas pessoas em nossas igrejas que não estão biblicamente convencidas sobre como entender estas questões; e muitas outras que embora biblicamente convencidas, não estão convencidas emocionalmente—compreendem o que a Bíblia diz, mas com certeza não consideram isto convincente.

Sete Maneiras Como Precisamos Responder

À medida que começamos a refletir sobre como responder a esta realidade cultural, precisamos levar em conta as seguintes sugestões.

1. Necessitamos ouvir com atenção.

Um dos versículos mais subutilizados no ministério pastoral é do livro de Provérbios: “Responder antes de ouvir é estultícia e vergonha”. (Pv 18.13).

Um ponto semelhante é feito alguns capítulos mais adiante: “Como águas profundas, são os propósitos do coração do homem, mas o homem de inteligência sabe descobri-los” (Pv. 20.5).

Necessitamos ouvir com atenção, pois seu ponto de partida muitas vezes não é imediatamente aparente. Nossos corações são “águas profundas”. Nossa impressão inicial sobre alguém, e suas palavras iniciais para nós, podem revelar apenas uma pequena parte daquilo que está nas profundezas de seu coração. Ouvir com atenção nos ajudará a perceber o que está acontecendo sob a superfície. Se alguém estiver disposto a compartilhar algo de sua história (e devemos sempre perguntar para ver se está, ao invés de simplesmente presumir que sim), então teremos uma noção de onde veio e como chegou até onde está agora. Ficaremos sabendo algo dos altos e baixos que vivenciou ao longo do caminho.

Isso pode nos ajudar a saber por onde começar a compartilhar algo de Cristo com eles. Se ficaram particularmente feridos ao longo do caminho, podemos começar falando sobre como Jesus não “esmagará a cana quebrada”; sobre como ele é alguém a quem realmente podemos confiar nossas dores mais profundas. Se identificarmos orgulho considerável, podemos mostrar como as palavras de Jesus sobre as questões de sexualidade são desafiadoras para nós todos e nos levam à humildade. Se notarmos confusão sobre quem são, ou uma sensação de inquietação e insatisfação com a vida, podemos mostrar a eles o encontro de Jesus com a mulher no poço em João 4, e como ele revela nossa identidade e também oferece água viva que sempre satisfará.

O perigo de não ouvir com atenção é falarmos reflexivamente, sem pensar e considerar nossas palavras devidamente. Podemos ser insensíveis, não tomando o tempo necessário para descobrir sensibilidades que possam estar presentes.

2. Não diga a alguém o que você não pode dizer a todos.

Há algum tempo fiz uma preleção em uma universidade secular no Canadá, e após a preleção, um estudante se aproximou de mim: “Sou gay e não sou cristão. Administrei um grupo de advocacia LGBTQ em outra faculdade. Li seu livro e estou me encontrando com um pastor para estudar o Evangelho de Marcos.” Intrigado por seu envolvimento em coisas cristãs, perguntei-lhe o que o estava atraindo para pensar sobre o cristianismo. Ele pensou por um momento antes de dizer: “Percebi que Jesus me trata da mesma maneira como ele trata todos os outros”. Ele explicou que o grupo de pressão que havia liderado se baseava na noção de que “somos diferentes: temos um desfile; vocês tem que nos celebrar. Quando chegava o mês do Orgulho, tentamos ver com quais empresas podemos obter mais coisas.”

Porém, ao começar a refletir sobre a mensagem de Jesus, ele percebeu que ele não  era diferente. E não queria ser diferente. No nível mais fundamental, a mensagem de Jesus para ele é exatamente a mesma que para todos os outros. Naquele momento, percebi que que com o evangelho, há uma igualdade que não existe em uma cultura que se orgulha de sua igualdade.

Um dos maiores equívocos que as pessoas têm em relação à sexualidade é que o cristianismo é injusto. Que temos um conjunto de regras para um grupo e outro conjunto para outro grupo. As pessoas pensam que odiamos e queremos condenar a comunidade gay. Presumem que os cristãos pensam que as pessoas LGBTQ+ estão abaixo deles.

A melhor maneira de corrigir este equívoco é mostrar como o evangelho nos coloca no mesmo barco. Jesus sempre nivela o campo de jogo. Todos nós estamos caídos e danificados em nossa sexualidade. Todos nós temos desejos desordenados. Nenhum de nós é tudo o que deveria ser nesta área. Cada um de nós tem que aprender a dizer não a certos desejos sexuais se quisermos seguir a Jesus.

O mesmo se aplica à identidade de gênero. Todos chegamos a Deus com uma visão profundamente deficiente da nossa própria identidade. Nenhum de nós realmente entende quem é, e todos nós baseamos nosso significado mais profundo e senso de si mesmo em coisas erradas. Quando se trata de disforia de gênero, todos nós vivenciamos formas de quebrantamento em nosso corpo físico. Nenhum de nós está em posição de ficar olhando os outros de cima para baixo, por mais diferente que seu estado caído possa parecer, em comparação a nós. Nenhum de nós é uma aberração; todos nós somos portadores da imagem dolorosamente distorcida de um Deus maravilhoso.

Isto não quer dizer que todos nós temos as mesmas experiências. Eu tenho experiência de viver em um corpo sujeito à mesma queda que todo mundo. Mas nunca vivenciei a dor da disforia de gênero. Portanto, embora eu deseje que alguém nessa luta saiba que estamos todos juntos nisso, não vou fingir saber o que eles estão passando. É necessário que me ensinem sobre este aspecto.

Nem quer dizer que todo pecado sexual é igual. Alguns pecados sexuais são mais graves do que outros. Alguns representam um maior distanciamento do modelo de Gênesis 1-2 de um homem e uma mulher em casamento de aliança. A bestialidade representa um distanciamento mais significativo do que o adultério, a homossexualidade do que a heterossexualidade. Mas em um mundo caído nenhum de nós tem motivos para se sentir superior. Todos nós, por natureza, estamos catastroficamente aquém da glória de Deus.

Portanto, particularmente nos estágios iniciais da interação, não diga a alguém o que você não pode dizer a todos. Deixe alguém saber o que o evangelho de Jesus diz a todos nesta questão, antes de tentar explicar o que ele diz para eles. Meu medo de outra forma é que eles possam pensar que estão sendo criticados de uma forma que os outros não são.

3. Reconheça o custo do discipulado para todos.

O custo do discipulado parece alto para aqueles que vêm à fé a partir de um contexto LGBTQ+. Mas isso não deve camuflar o fato de que o custo do discipulado é elevado para todos. Jesus disse: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me” (Mc 8.34). A palavra chave é alguém. Para seguir Jesus, todos nós teremos que dizer um não forte e profundo a algumas das nossas intuições e anseios mais profundos. Jesus não coloca o “a si mesmo” junto à “identidade”; ele o coloca junto à “negação”.

Este chamado necessita ser explicitado. Jesus logo adiante diz que há uma sensação de “perder a nossa vida” ao segui-lo (v. 35), que haverá momentos em que parece que a obediência a Ele está nos tirando a vida. No entanto, o paradoxo glorioso é que, ao passar por esta perda, estamos realmente ganhando vida. Negando a nós mesmos e seguindo Jesus, não nos tornamos menos quem somos; nos tornamos mais verdadeiramente nós mesmos.

Mas este custo do discipulado vai parecer cruel e incomum se for aplicado rigorosamente àqueles com antecedentes LGBTQ+ que seguem a Cristo, mas não for aplicado a todos os outros. Se o custo do discipulado for alto demais para as pessoas LGBTQ+, então é alto demais para qualquer um.

4. Mostre a bondade de Deus.

Um amigo meu tem uma filha de 2 anos que, na maioria das vezes, é um deleite absoluto, mas na hora das refeições é—como devo dizer isso?—desafiadora. Como muitas crianças de 2 anos, a comida é frequentemente considerada inaceitável para ela, independentemente de ser sua favorita alguns dias antes. Não será preciso dizer que isso é exasperante para seus pais que querem que ela seja bem alimentada e grata, de preferência sem ter comida arremessada pela sala a intervalos regulares.

O problema é que muitas pessoas veem Deus como aquela menina de 2 anos. Acham que ele decide arbitrariamente que não gosta de certas coisas, e a ética sexual bíblica parece confirmar esta visão. Tudo parece tão aleatório.

Assim sendo, não basta simplesmente ensinar o que a Bíblia diz. É necessário ensinar o porquê da Bíblia dizer isto, para mostrar que há racionalidade e bondade naquilo que Deus diz.

Toda vez que Deus nos dá uma proibição, ele está protegendo algo bom. Portanto, é necessário ensinar os positivos por trás dos negativos, e mostrar que a Palavra de Deus não é de fato arbitrária, mas sim aponta para o que é melhor e para aquilo que nos dá vida. Sempre que Deus diz não a algo, ele está dizendo um sim muito maior para outra coisa. A menos que empolguemos as pessoas com a visão bíblica para o casamento e a sexualidade humana—especialmente como apontam para além de si mesmos para o amor de Deus mostrado a nós em Cristo—não estaremos fornecendo todos os recursos espirituais necessários para combater desejos pecaminosos profundos e aflitivos. Como Thomas Chalmers nos lembrou há vários séculos, necessitamos do “poder expulsivo de um novo afeto”.

Refutar não é persuadir. Apontar os erros do pensamento não bíblico não irá por si só, despertar os corações para a verdade de Deus.

5. Necessitamos manter em vista o enredo da Bíblia.

Em última análise, o casamento é uma questão bíblico-teológica. A Bíblia começa com um casamento, entre Adão e Eva, e termina com um casamento, entre Cristo e sua noiva. O primeiro casamento aponta para o casamento final.

Não é por acaso que o enredo da Bíblia começa em um jardim com um homem e uma mulher se juntando. Foram feitos um para o outro. A criação binária de homens e mulheres unidos é uma imagem da eventual união do céu e da terra, quando todos os casamentos humanos acabarão e deixarão o palco para o casamento final entre Jesus e seu povo. Isto é uma coisa inebriante e bonita. É uma narrativa na qual todos entramos e antecipamos em nosso estado terreno agora, sejamos casados ou solteiros. Se o casamento aponta para a forma do evangelho, então o ser solteiro aponta para sua suficiência, pois a união com Cristo é o único casamento do qual realmente necessitamos.

Assim sendo, não se pode mexer com a definição de casamento sem ir contra o fundamento daquilo que toda a Bíblia significa. Nossa teologia do casamento flui de nossa compreensão do evangelho. É por isso que não conheço nenhuma igreja que tenha mudado sua visão do casamento sem também, em última análise, mudar sua visão do evangelho.

Isto também nos mostra o cerne de toda a nossa reflexão teológica e debates sobre a sexualidade humana. Mesmo que a Bíblia não fizesse menção direta à homossexualidade, ainda assim saberíamos como pensar sobre estes assuntos, dado o que as Escrituras dizem sobre o casamento ser, por definição, heterossexual e o único contexto piedoso para a atividade sexual. A Bíblia não nos dá uma teologia da homossexualidade; dá-nos uma teologia do casamento. Que é em si uma teologia do evangelho.

6. Necessitamos continuar apontando para Jesus.

Necessitamos apontar para a vida de Jesus. A pessoa mais humana e completa que já viveu não era casada, nāo teve relacionamentos românticos, e não fez sexo. Portanto, embora (no contexto apropriado) estas sejam dádivas boas, não podem ser essenciais para a realização humana individual. Dizer que necessitamos tê-las para sermos completos é diminuir a humanidade de Cristo, aquilo que as Escrituras advertem ser o espírito do anticristo (1Jo 4.3).

Necessitamos apontar para os ensinamentos de Jesus. Ele ensinou que o sexo fora do casamento é pecaminoso (Mt 15.19-20 e paralelos), que a concupiscência sexual e não apenas o comportamento é moralmente culpável (Mt 5.28), que o casamento é entre um homem e uma mulher (Mt 19.3-6), e que a única alternativa piedosa ao casamento é o celibato (Mt 19.10-12). Temos que aceitar estes ensinamentos. Ao contrário da impressão comum hoje em dia, Jesus não é neutro quando se trata de ética sexual.

Se tivermos problema com estas posições, nosso problema não é com a igreja, ou com o movimento evangélico, ou com o cristianismo, mas com o próprio Cristo. Não podemos nos afastar destas crenças sem nos afastarmos dele. Cremos no que cremos sobre o casamento e a sexualidade porque cremos no que cremos sobre Jesus. Se alguém quer que eu abandone minha visão do casamento, necessita primeiro me persuadir a abandonar minha visão de Cristo. Como diz o ditado, “Aqueles que não ouvem a música acham os dançarinos loucos.” Não podemos esperar que as pessoas compreendam completamente como vivemos e no que cremos, a menos que compreendam quem Cristo é para nós.

Finalmente, necessitamos apontar para as reivindicações de Jesus. Só Ele traz satisfação final e duradoura (Jo 6.35). De fato, Deus criou a sexualidade humana por esta razão: apontar para um apetite mais profundo, um desejo mais poderoso e uma maior consumação que só pode ser encontrada nele. Jesus e não a realização sexual ou qualquer outro ídolo contemporâneo, é aquele que realmente alimenta e preenche nossas almas.

7. Necessitamos de confiança no evangelho.

Lendo entre as linhas dos primeiros versículos de Romanos 1, parece que os crentes em Roma pensavam que Paulo estava relutante em ir até eles. Sua mensagem do evangelho havia dado frutos nas províncias do império, mas eles estavam em Roma. Era diferente. Roma era o centro e ápice do mundo. O pensamento grego e a influência grega podiam ser vistos por todos os lados. O que o evangelho poderia ter a oferecer aqui?

Portanto, Paulo deixa claro que não foi relutância que o afastara de Roma. Muito pelo contrário:

Porque Deus, a quem sirvo em meu espírito, no evangelho de seu Filho, é minha testemunha de como incessantemente faço menção de vós em todas as minhas orações, suplicando que, nalgum tempo, pela vontade de Deus, se me ofereça boa ocasião de visitar-vos. Porque muito desejo ver-vos, a fim de repartir convosco algum dom espiritual, para que sejais confirmados, isto é, para que, em vossa companhia, reciprocamente nos confortemos por intermédio da fé mútua, vossa e minha. Porque não quero, irmãos, que ignoreis que, muitas vezes, me propus ir ter convosco (no que tenho sido, até agora, impedido), para conseguir igualmente entre vós algum fruto, como também entre os outros gentios. Pois sou devedor tanto a gregos como a bárbaros, tanto a sábios como a ignorantes por isso, quanto está em mim, estou pronto a anunciar o evangelho também a vós outros, em Roma.

Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego (Ro 1.9-16, ênfase minha)

Tal como os cristãos romanos se sentiam sobre seus concidadãos estarem além do alcance do evangelho, muitos de nós hoje podemos nos sentir também em relação à comunidade LGBTQ+, como se o evangelho fosse de alguma forma menos eficaz com essa parte da nossa sociedade. No entanto, Deus não precisa de mais força ou graça para salvar um tipo de pecador do que qualquer outro.

Quando se trata de responder às mudanças culturais que vemos ao nosso redor, não devemos pensar que nosso trabalho é simplesmente “manter a linha”. Em vez disso, é descobrir com Paulo a colheita que nos espera.

Traduzido por Felipe Barnabé.

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