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Duas vitórias na Geórgia dão a democratas controle do Senado e impõem nova derrota a Trump – O Globo

O Partido Democrata terá a maioria no Senado americano após conquistar, nesta quarta, os dois assentos disputados em um histórico segundo turno na Geórgia. A vitória no estado, um antigo reduto republicano que passa por profundas mudanças sociodemográficas, é um triunfo para a governabilidade de Biden e dos democratas, que controlarão as duas Casas do Legislativo pelos próximos dois anos.

O resultado, mais uma derrota para o presidente Donald Trump, é indissociável de sua fracassada ofensiva para se manter na Casa Branca e das fissuras que causa em seu próprio partido. Para republicanos críticos ao ocupante do Salão Oval, o comportamento presidencial é um fator-chave para explicar a perda da maioria no Senado após seis anos.

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A vitória do democrata Jon Ossoff foi anunciada no final desta tarde, após o candidato conseguir uma diferença de mais de 0,5% dos votos em relação ao seu adversário, o ex-senador republicano David Perdue, cujo mandato se encerrou no último domingo — o percentual é a margem mínima para que não haja uma recontagem, segundo a lei estadual da Geórgia. Com 33 anos, Ossoff será a pessoa mais jovem a ocupar um assento no Senado desde 1973, quando Biden se elegeu pela primeira vez, aos 29 anos. Uma estrela em ascensão no Partido Democrata, o documentarista comemorou a vitória antes mesmo do resultado ser confirmado.

—  Quero agradecer ao povo da Geórgia por participar desta eleição. Tenha você votado em mim ou não, o representarei no Senado — afirmou.

Mais cedo, o reverendo Raphael Warnock derrotou a senadora Kelly Loeffler, tornando-se a primeira pessoa negra a representar a Geórgia no Senado e o primeiro democrata negro eleito por um ex-estado confederado. Com 98% dos votos apurados, o reverendo da Igreja Batista Ebenézer, antiga congregação de Martin Luther King, tem 50,7% dos votos, contra 49,3% de Loeffler, que ainda não admitiu a derrota e disse ter “um caminho para a vitória”.

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Com Ossoff e Warnock, democratas e republicanos terão, cada um, 50 senadores. O voto de minerva, no entanto, caberá à vice-presidente Kamala Harris, que acumula a função de presidente do Senado. Apesar de estreita, a maioria abre caminho para que os democratas avancem sua agenda legislativa com maior facilidade.

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Litígios à vista

Em um tuíte, Biden disse ter telefonado para ambos os senadores para parabenizá-los por sua vitória. O resultado foi comemorado também pelo atual líder da minoria democrata no Senado, Chuck Schumer. Em um comunicado, ele ressaltou que o país atravessa uma das eras mais duras de sua História, mas se sente como se “um novo dia” estivesse começando e que o comando democrata será “muito bom para o povo americano”.

Entretanto, diante da atmosfera litigiosa incentivada por Trump, é provável que a disputa vá parar na Justiça. O resultado das eleições presidenciais no estado, um dos epicentros da cruzada legal do presidente, passou por duas recontagens e uma série de litígios que confirmaram o triunfo de Biden por 0,2 ponto percentual. Desta vez, no entanto, ambas as disputas estão além da margem para a recontagem.

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Até poucos anos, não era cogitável que a Geórgia pudesse enviar dois democratas para o Senado: antes da estreita vitória de Biden em novembro, havia 28 anos que um candidato democrata à Presidência não era o mais votado por lá. Desde 2000, o partido não elegia sequer um senador no estado, cujo sistema eleitoral ainda limita a participação política de grupos minoritários e carrega heranças segregacionistas.

Isto, em parte, deve-se ao acelerado crescimento populacional e às significativas mudanças demográficas que o estado atravessa: seus subúrbios historicamente brancos veem um aumento de moradores negros, latinos e asiáticos. Moradores de estados como Califórnia, Nova York e Illinois, pólos democratas, também imigram para lá em busca de empregos e menor custo de vida.

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Infraestrutura democrata

O triunfo, no entanto, deve-se a um esforço de uma década liderado por Stacey Abrams, democrata negra que quase se elegeu senadora em 2018. O partido se mobilizou para ampliar sua infraestrutura política no estado, registrando novos eleitores e incentivando o voto entre grupos minoritários. O foco era a população negra, cerca de 30% dos moradores do estado.

Segundo o Instituto Pew, nos últimos 20 anos, 48% dos 1,9 milhão de novos eleitores registrados no estado eram negros. Os votantes brancos continuam a ser a maioria, mas representação no total caiu de 63% em 2008 para 53% em 2020. Ao parabenizar Warnock pela simbologia de sua eleição, o ex-presidente Barack Obama destacou o trabalho de Abrams, chamando-o de “resiliente e visionário”.

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Na reta final para o segundo turno, as campanhas de Warnock e Ossoff arrecadaram cada uma mais de US$ 100 milhões em doações, quantias recordes para corridas legislativas que deram ainda mais impulso ao movimento.

O sucesso foi palpável: uma pesquisa feita pela Associated Press na terça-feira mostra que a população negra compôs 32% do eleitorado que foi às urnas neste segundo turno, mais que os 29% registrados em novembro. Em mais de 93% dos casos, votaram em candidatos democratas, em um claro rechaço à retórica racista que dominou Washington pelos últimos quatro anos.

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Na conta de Trump

O comparecimento em redutos republicanos, por sua vez, ficou aquém do esperado. No condado de Cobb, por exemplo, a margem de votos obtida por Perdue foi de 44%, 11 pontos percentuais a menos que em 2016.Para autoridades republicanas críticas da Casa Branca, a culpa pela derrota recai sobre a retórica virulenta de Trump.

Por um lado, o presidente repele grupos conservadores que não veem sentido em participar de uma eleição que consideram, mesmo sem quaisquer evidências, ser fraudada. Por outro, causou uma  fissura no Partido Republicano local, cujas lideranças tornaram-se suas algozes por atestar a lisura da eleição, e afastou setores moderados.

Para o senador Mitt Romney, crítico ferrenho de Trump, “dizer para os eleitores que a eleição é fraudada não é, no final das contas, uma boa maneira de atraí-los”. Quem expressou sentimento similar foi Gabriel Sterling, principal autoridade eleitoral da Geórgia, que disse creditar “100% da culpa” pela derrota ao presidente.

Loeffler e Perdue mantiveram-se leais a Trump durante toda a campanha, chegando a demandar a renúncia do secretário de Estado da Geórgia, o republicano Brad Raffensperger, que atestou a lisura do pleito. Ambos apoiam os esforços para bloquear a confirmação da vitória de Biden no Congresso nesta quarta, etapa derradeira antes da posse. A senadora, que permanece no poder até a posse de Warnock, inclusive, será uma das que levantará objeções ao resultado.

A estratégia republicana de campanha, focada em retratar seus adversários como “radicais” que dariam o controle em Washington para os “socialistas”, também foi evidentemente rechaçada. Ossoff e Warnock, por sua vez, descreviam Loeffler e Perdue como multimilionários desconectados da realidade. O marido da senadora, recentemente, tornou-se bilionário.

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