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As Melhores Novas Que Se Possa Imaginar

Muitos reformadores protestantes declararam que a justificação é a doutrina pela qual a igreja permanece ou cai. Quanto mais compreendo o evangelho e as necessidades de meu coração caído, mais sinto que tendo a permanecer ou a cair a cada dia, dependendo se estou ou não, vivendo a minha justificação.

Por que a justificação é tão importante? Que diferença ela faz na rotina diária? De que modo ela comunica boas novas tanto para o cristão sobrecarregado por uma consciência ansiosa quanto para o não cristão assombrado por um senso de falta de sentido?

A fim de aprender mais sobre a doutrina da justificação e como viver em seu poder diariamente, me correspondi com Tom Schreiner, professor de interpretação do Novo Testamento no seminário Southern Baptist Theological Seminary em Louisville, Kentucky, EUA. Quem já ouviu com apreço as várias apresentações de Schreiner sobre a justificação na Evangelical Theological Society (ETS) ficará animado em conhecer seu livro Somente pela fé—A doutrina da justificação (Cultura Cristã, 2018)].

Que sentido se pretende com a expressão “justificação somente pela fé”? Em que lugar da Bíblia podemos aprender mais a respeito desta doutrina?

A justificação somente pela fé significa que somos considerados justos diante de Deus em razão da fé e não de nossas obras. Na formulação protestante clássica da doutrina, a justificação não tem a ver com tornar alguém justo, mas, sim declarar alguém justo. Quando nos referimos à justificação somente pela fé, isto não quer dizer que a fé é nossa justiça. Em vez disso, nossa fé nos une a Jesus Cristo, o qual é a nossa justiça. Nossa justiça, portanto, não está em nós mesmos, mas em Jesus Cristo crucificado e ressurreto. A justiça de Cristo nos é imputada pela fé, de modo que tanto o perdão dos pecados quanto nossa justiça são dons de Deus.

Os textos clássicos que apoiam este ensino são Romanos 3.21-4.25 e Gálatas 2.16-3.14. Vemos ilustrações poderosas deste ensino no ato de Jesus perdoar a mulher pecadora (Lucas 7.36-50) e na parábola do fariseu e do publicano (Lucas 18.9-14).

Esta doutrina é frequentemente mal interpretada. Não deveríamos concluir que as boas obras são desnecessárias ou sem importância, pois as boas obras também são necessárias para a justificação. Mas elas são necessárias enquanto fruto ou evidência da justificação (Tiago 2.14-26). Nossas boas obras não são o fundamento de nossa justificação. Uma vez que Deus exige perfeição, somente a justiça de Cristo pode ser o fundamento de nossa justiça.

Em sua própria vida ou em seu ministério, que diferença faz a doutrina da justificação somente pela fé?

Estas são as melhores novas do mundo, pois, se a justificação é somente pela fé, então há esperança para qualquer pecador, sem importar para o quão longe de Deus tenhamos caído. Em meu ministério, desejo proclamar continuamente as boas novas de que nossa justiça não reside em nós mesmos, mas em Jesus Cristo. Se, como escreveu C.S.Lewis, o pecado maior é o orgulho, a justificação somente pela fé nos lembra que não temos qualquer razão para a auto-adoração, pois nossa condição de justos perante Deus depende de Jesus Cristo a quem é dada toda a glória, todo o louvor e toda honra. A cada dia, sou tentado a me vangloriar e descansar em mim mesmo, mas esta doutrina me lembra que só posso gloriar em Jesus Cristo e Ele crucificado (Gálatas 6.14).

Para cristãos que lutam contra a ansiedade referente à segurança de sua salvação ou a condição de sua consciência, que diferença faz a justificação pela fé somente?

Quando J. Gresham Machen, o grande erudito presbiteriano de Novo Testamento e fundador do Westminster Seminary, estava para morrer, ele se lembrou da justificação somente pela fé. Quando pensamos sobre a morte, com frequência, pensamos sobre nossos pecados e tememos o juízo e a ira de Deus. Mas, quando estava para morrer, Machen disse: “Sou tão grato pela obediência ativa de Cristo. Não há esperança sem ela.” Em outras palavras, quando estava para se encontrar com Deus, Machen descansou na justiça de Cristo e não em suas próprias obras.

Este é o bálsamo que precisamos aplicar à nossa consciência. Nossa causa perante Deus não é baseada naquilo que fizemos, mas naquilo que ele fez por nós em Jesus Cristo. Quando somos atacados pelo medo do juízo, nos lembramos das palavras de Romanos 8.33-34. Deus não nos acusará, pois ele nos justificou em Jesus. Ele não nos condenará, pois Jesus morreu por nossos pecados, foi ressuscitado como justificado e, agora, reina triunfante, intercedendo por nós.

Há algum sentido em que até mesmo um secularista busca ser justificado por suas obras? Se sim, como esta doutrina poderia impactar a maneira como compartilhamos o evangelho com um ateu?

Todos nós, de uma forma ou de outra, tentamos validar nossa existência com base naquilo que realizamos. Na origem do nosso impulso em ser bem-sucedidos está o desejo de auto-adoração, e isso se aplica tanto ao ateu quanto ao arquiteto. Tudo o que fazemos na vida, desde como somos avaliados como pregadores até as notas recebidas na escola, é avaliado por aquilo que fazemos. Tais avaliações, é claro, não estão erradas. No entanto, no final das contas, ninguém encontra satisfação e alegria com base naquilo que realiza; há sempre um vazio, uma sensação de incompletude e futilidade em nosso próprio trabalho.

Portanto, podemos dizer a um ateu: “Seu sentimento de falta de sentido para a vida se deve em parte, ao desejo de fazer-se grande. Você jamais encontrará sentido e alegria assim, pois há somente um que é verdadeiramente grande; há somente um que merece toda a nossa adoração e louvor. Você só encontrará descanso quando =descansar nele e na justiça que ele dá àqueles que confiam nele.”

Martinho Lutero escreveu: “O artigo da justificação deve soar em nossos ouvidos incessantemente, pois a fragilidade de nossa carne não nos permitirá agarrá-lo perfeitamente e crer nele de todo nosso coração”. Que conselho você tem para que esta verdade se aprofunde mais e passe de nossa cabeça para nosso coração?

Lutero também disse que devemos reconhecer que jamais seremos mestres desta verdade, mas sempre alunos. Não há uma fórmula que podemos reproduzir. Aprendemos sobre a justificação somente pela fé na fornalha da vida. Reconhecer que estamos propensos a esquecer esta verdade. Não somos justificados por entendermos perfeitamente ou vivermos a verdade da justificação somente pela fé. Esquecemos isto constantemente! Nos esforçamos e nos esforçamos, e, então, percebemos continuamente, ao Espírito Santo operar em nossos corações: “Nada trago em minhas mãos. Simplesmente me apego à tua cruz.”

A meditação diária sobre o evangelho e as Escrituras ajuda. Ler o grande comentário de Lutero de 1535 sobre Gálatas também nos ajuda. Ouvir regularmente a Palavra de Deus pregada fielmente é uma grande benção. Precisamos nos lembrar diariamente de nossa pobreza e de nossas riquezas. Se alguma vez pensarmos que nos graduamos nesta escola, estamos em perigo mortal de esquecer que somos justificados somente pela fé. Felizmente, Deus traz provações para nos lembrar que, como Lutero disse próximo de morrer, “somos mendigos. Isto é verdade.”

A doutrina da justificação pela fé tem gerado muita controvérsia na igreja recentemente, especialmente em relação à chamada “nova perspectiva sobre Paulo”. Você poderia recomendar alguns recursos para pessoas que desejam se envolver neste debate?

O melhor livro extenso para se ficar conhecendo algo sobre este assunto é o de Stephen Westerholm: Perspectives Old and New on Paul: The “Lutheran” Paul and His Critics (Eerdmans, 2003) [Perspectivas Antigas e Novas sobre Paulo: O Paulo “Luterano” e Seus Críticos] . Penso que o melhor pequeno livro é o mais recente de Westerholm: Justification Reconsidered: Rethinking a Pauline Theme (Eerdmans, 2013) [Justificação Reconsiderada: Repensando um Tema Paulino].

Traduzido por Abner Arrais.

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