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Análise: Por ora, Lukashenko sobrevive a protestos, mas preço cobrado por Moscou pode ser alto demais – Jornal O Globo

A posse secreta de Alexander Lukashenko,  longe dos olhares do público (não houve sequer transmissão ao vivo) para o o sexto mandato como líder da Bielorrússia serve como uma representação do atual momento do homem conhecido pela alcunha de “Batka”, “pai” em bielorrusso: desconectado das ruas, mas com o forte apoio da elite.

Depois de uma eleição cujos resultados foram rejeitados por quase todas nações ocidentais, em agosto, Lukashenko ainda enfrenta aquela que já é considerada a maior e mais duradoura onda de protestos desde a independência do país da antiga União Soviética, em 1991.

Em seus primeiros momentos, ele lançou uma repressão extrema, com milhares de presos e denúnicias de tortura e abuso sexual. Diante de greves nas fábricas estatais, ameaçou com demissões e prisões, minando o apoio que tinha entre os operários. Aos seus opositores, incluindo a rival na eleição, Svetlana Tikhanovskaya, destinou a prisão ou o exílio no exterior.

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Batka já enfrentava protestos mesmo antes da votação de agosto, tal qual em diversas ocasiões no passado. Sua aprovação real, como revelada por uma pesquisa do estatal Instituto de Sociologia da Academia Nacional de Ciências, girava em torno de 24% em junho na capital, Minsk. E sua gestão negacionista da Covid-19 provocou muitas críticas, mesmo em um país onde a imprensa e vozes dissonantes são controladas de perto.

Mesmo assim, ele prosseguiu à frente do governo.

Em artigo publicado no jornal Moscow Times dias antes da eleição, Gennady Rudkevich, professor de Relações Internacionais da Faculdade e Universidade do Estado da Geórgia (EUA), deu algumas pistas sobre o que estaria por trás dessa sobrevivência.

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A principal delas, em termos locais, é que Lukashenko ainda mantém o apoio da elite econômica e política, uma afirmação que ainda se mostra válida mesmo depois de semanas de protestos.

Apesar de ser um movimento orgânico, sem aparentes influências externas ou étnicas, como no caso da Ucrânia, a oposição bielorrussa sente os efeitos da destruição da sociedade civil nas últimas décadas. Diante da ausência de deserções de nomes ligados ao status quo, o movimento se vê estagnado: as milhares de pessoas seguem nas ruas, mas longe de conseguir avanços práticos.

Por outro lado, Batka precisou abandonar a popular retórica nacionalista, que incluía um embate direto com a Rússia e acenos à Europa, quando escolheu o caminho da manipulação dos resultados eleitorais e da repressão.

Isolado externamente, recorreu a Moscou, obtendo um empréstimo de US$ 1,5 bilhão (R$ 8,3 bilhões), que, segundo analistas, será em grande parte usado para pagar dívidas com a própria Rússia, e que não chega nem perto do necessário para evitar um colapso econômico.

Vladimir Putin, que evitou inicialmente o tema Bielorrússia, recentemente declarou apoio ao “aliado mais próximo”. Mas o preço a ser cobrado deve ser alto: a dependência econômica passará a ser também política, pondo o país de maneira definitiva dentro da órbita de Moscou, e nem mesmo o cargo de Batka é dado como garantido.

Nos últimos anos, o longevo presidente bielorrusso é visto como cada vez mais desconfiança dentro dos muros vermelhos do Kremlin. Ao mesmo tempo, a ideia de permitir que a ex-nação soviética conduza seu próprio processo de transição é carta fora do baralho.

Putin teme ver surgir mais uma nação voltada à Europa perto de suas fronteiras, e fará o possível para manter a Bielorrússia em sua área de influência — mesmo se isso incluir a troca de Lukashenko por um nome mais alinhado aos interesses russos.

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