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Missões Vāo Além de Grupos Nāo Alcançados

Em meados do século XX, alguns cristãos evangélicos achavam que estávamos prestes a cumprir a Grande Comissão pois havia cristãos localizados em quase todos os países geográficos do mundo. Mas no Primeiro Congresso Internacional de Evangelização Mundial, em julho de 1974, em Lausanne, Suíça, Ralph Winter alertou os cristãos triunfantes sobre “cegueira em ver povos” e “povos ocultos”. Ele reconheceu que alguns países geográficos contêm simultaneamente grupos de pessoas muito evangelizados e outros completamente não evangelizados (por exemplo, a China).

O reconhecimento de Winter levou a uma mudança significativa de paradigma na estratégia de missões, que colocou o foco nos chamados “grupos de pessoas não alcançados” em todo o mundo. Após mais de 40 anos do discurso que alterou estratégias em Lausanne, o debate continua. Quero fornecer algum contexto histórico, expressar alguma cautela e apresentar uma retificação para a estratégia de “grupo de povos não alcançados” que tem tido tāo grande influência nas estratégias globais de missões hoje em dia.

Contexto

Winter enfatizou povos não alcançados porque achava que eles estavam sendo ignorados e negligenciados. A esmagadora maioria dos missionários cristãos naquela época estava trabalhando em contextos onde cristãos e igrejas já estavam presentes. Ele afirmou: “Precisamente onde a tarefa transcultural é maior, o número de obreiros transculturais é o mais exíguo”. Assim, as igrejas tiveram que repensar sua estratégia de missão global para assegurar que o evangelho fosse proclamado a estes povos não alcançados.

O discurso de Winter iniciou uma mudança missiológica em que o direcionamento passou das regiões geográficas para o alcançar grupos de pessoas. Sua noção de grupos de pessoas não alcançados foi lapidada nos anos seguintes. Vários Comitês de Trabalho de Lausanne nas décadas de 1970 e 1980 labutaram para definir o conceito de grupo de pessoas e, em seguida, continuaram o esforço para definir “alcançados” e “não alcançados”.

No final, depois de muita deliberação e diálogo ao longo de muitos anos, a comunidade missiológica (Joshua Project, IMB, AD 2000, entre outros) decidiu que, uma vez que 2% de um grupo de pessoas são cristãos, esse grupo é considerado “alcançado”. A linha demarcatória de 2 por cento não tem base bíblica mas influenciou as estratégias.

Cautela

Sou grato pela ênfase de Winter em povos não alcançados e considero que ele forneceu um corretivo necessário para as estratégias de missões. No entanto, quero compartilhar várias desvantagens que observei na estratégia de grupos de povos-não-alcançados durante meu tempo, tanto no campo de missões como também trabalhando em uma organização de envio de missionários.

Primeiramente, necessitamos sempre lembrar que o número de 2 por cento é arbitrário. Originalmente, aqueles que definiram um grupo de pessoas não alcançadas propuseram 20% como linha demarcatória (ver Alan Johnson, “Major Concepts of the Frontier Mission Movement”). Outras escalas e números foram propostos mais tarde. Evangelical Missions Quarterly publicou um artigo em julho de 1990 intitulado “O Que Significa ‘Alcançado’?” Naquele artigo há muito pouco consenso entre os entrevistados. Alguns usam “alcançado” quando se referem a engajamento, enquanto outros usam este termo para medir o número de crentes. De qualquer forma, é fundamental que consideremos esta designação de forma leve e que a usemos como um meio para influenciar — mas não para ditar — as estratégias de missões.

Em segundo lugar, o engajamento missionário não equivale à conclusão da tarefa missionária. Na corrida para realizar a Grande Comissão e cumprir as palavras de Jesus em Mateus 24.14, alguns querem igualar o engajamento de grupos de pessoas com a conclusão da Grande Comissão. Slogans tais como “terminar a tarefa” podem ser úteis na comunicação da urgência da missão, mas também podem contribuir para a noção de que engajamento é a mesma coisa que a conclusão. A principal atividade da Grande Comissão não é engajamento, mas fazer discípulos.

Em terceiro lugar, com relaçāo à estratégia de grupo de pessoas, muitas vezes mudam o local das traves do gol, para usar uma metáfora do futebol. Os missiólogos e pesquisadores admitem abertamente que novos grupos de pessoas estão sempre sendo descobertos. E com o aumento da urbanização, as pessoas estão se mudando para cidades globais e se assimilando a outros grupos de cultura similar. Tudo isso torna a estratégia de grupo de pessoas difícil de medir e completar com precisão.

Em quarto lugar, embora listas de grupos de pessoas e gráficos possam ser úteis, qualquer um que tenha vivido no exterior sabe como as coisas podem ser mais complicadas no campo. As pessoas nem sempre se identificam de forma consistente com as listas de grupos de pessoas. A migração, as nuances linguísticas e expressões culturais podem mudar a forma como as pessoas se identificam. Assim, é imperativo usar as listas como guias e ferramentas, mas tendo em mente que elas são apenas guias e ferramentas.

Retificaçāo

Nos últimos anos, tem havido um esforço para enfatizar o conceito de “lugar”, ao lado da ênfase sobre o conceito de “povos” (ver Zane Pratt e David Platt). Aprovo esta retificação e acho que ela ajuda a trazer um equilíbrio saudável para as estratégias e diálogo sobre povos-não-alcançados. O Novo Testamento certamente fala de locais geográficos à medida que o evangelho avança. Além disso, em Rm 15.19 Paulo enquadra sua missão e eficácia em termos geográficos (de Jerusalém ao Ilírico). Portanto, a tentativa de reconcentrar a atenção no “lugar” tem respaldo bíblico, e é necessário que se dê maior atenção a isto no diálogo que ocorre sobre povos-não-alcançados.

Como observei anteriormente, o aumento da urbanização está criando uma variedade de desafios para as estratégias para povos-não-alcançados. Portanto, a inclusão de lugar ao lado de povos permite que igrejas e organizações de missões identifiquem o estado da igreja em uma determinada localização geográfica, bem como em diferentes grupos de pessoas. A Grande Comissão obriga-nos a voltar nossa atenção e os nossos esforços tanto para o povo malaio como para a cidade de Kuala Lumpur.

Jesus comissionou seus discípulos para irem e fazerem discípulos de todas as nações. Este mandamento requer foco nos povos e também nos lugares. O debate continua sobre o que constitui um povo ou lugar que está sendo “alcançado” com o evangelho. Tais debates e diálogos devem nos fazer recordar que necessitamos ser flexíveis em nossas estratégias e abordagens e, finalmente, nos submeter às Escrituras como nosso guia primordial. Nosso Rei nos deu uma tarefa. Que todos sejamos fiéis em nossas tentativas de completá-la.

Traduzido por Luiz Santana

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