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É o “mecanismo”

J.R. Guzzo

Publicado na Gazeta do Povo, em 26 de novembro de 2020

comício de boulos

Foto: Divulgação/Instagram/Guilherme Boulos

Eis aqui mais um retrato da vida como ela é, e não como imaginam que ela seja nas mesas redondas que discutem política na televisão. Um dos maiores doadores para a campanha do candidato que se apresenta como de “esquerda-raiz” para a prefeitura de São Paulo não é nenhum sindicato de trabalhadores – e o dinheiro não vem de nenhuma vaquinha de “pessoas em situação de rua”, os grandes clientes nominais do Partido Socialismo e Liberdade. Quem aparece na papelada da justiça eleitoral como a terceira maior doadora da campanha paulistana do PSOL, com um total de 88.000 reais, é uma herdeira da empreiteira de obras públicas Andrade Gutierrez. E daí? Milionário também é gente; tem todo o direito de doar seu dinheiro para quem bem entende. O problema não está aí. Está numa razão social: “Andrade Gutierrez”.

A construtora, como se sabe, é uma das empresas mais corruptas do Brasil – não porque costumava aparecer regularmente no noticiário da ladroagem nacional, mas porque são seus próprios diretores que dizem que ela é corrupta. Tanto é assim que eles mesmos, por sua livre e espontânea vontade, confessaram os crimes da empresa no assalto geral ao dinheiro público empreendido durante os governos Lula-Dilma. Mais: fizeram “delação premiada” na Operação Lava Jato”. Mais ainda: devolveram ao erário 1 bilhão do dinheiro roubado. (Alguém, “na jurídica” ou “na física”, devolve voluntariamente dinheiro que não roubou? Ainda não se sabe de nenhum caso.)
É a velha história: quando se trata de dinheiro, dizia Voltaire, todo mundo é da mesma religião. A diferença entre os altos propósitos socialistas do partido e o dinheiro da herdeira é igual a zero; política real é isso, e não conversa que só aparece em jornal, rádio e televisão. O PSOL tem o direito de receber e a doadora tem o direito de doar, é claro, mas sempre é bom ficar claro que as coisas são assim – e que não têm nada a ver com o palavrório de campanha. É o “mecanismo”. É assim que ele funciona.

O maior doador da campanha do PSOL em São Paulo é o cantor Caetano Veloso, outra estrela da nossa elite capitalista, com 100.000 reais. Mas há uma diferença, aí. Caetano ganhou esse dinheiro unicamente com o seu trabalho – e não se chama Andrade, nem Gutierrez.

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