terça-feira, abril 16Notícias Importantes
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Como o Salmo 113 Mudou Minha Vida

Minha introdução ao Salmo 113 foi quando o cantei com outros num culto corporativo. Foi há 21 anos e eu estava ostentando um corte de cabelo masculino e piercings extras na minha orelha direita—pois na época pensava que a esquerda estava certa (hetero) e a direita estava errada (gay). Estava em um banco na Igreja Presbiteriana Reformada de Syracuse, buscando desajeitadamente um Deus que eu secretamente esperava me aceitasse como eu era. Floy Smith, a esposa do pastor, estava ao meu lado. Floy, uma mulher que sabia interpretar vários mundos para mim, roçou-me com o ombro antes de começarmos a cantar. “Deus está fazendo de você Seu belo trou, minha querida”, sussurrou no meu ouvido, na orelha com os piercings extras. O pastor Ken Smith nos pediu para abrirmos os Saltérios ao Salmo 113A para cantarmos.

Me lancei naquilo de todo coração.

Mas antes de perceber o que estava saindo da minha boca, cantei as últimas linhas do salmo e me vi envolvida no que eu considerava como um patriarcado odioso e uma misoginia institucionalizada.

Como muitas coisas que me pegaram em meio a um salto, este salmo começa com o que percebi ser terreno seguro. Um cântico de louvor a um Deus que tem que se inclinar para examinar sua criação: Ele se abaixa para examinar as estrelas, a lua e o sol. Ele não tenta justificar sua autoridade sobre a criação, e então faz com que ossos mortos vivam. Ele diz às montanhas para se erguerem e elas obedecem sem reclamar. Ele até se inclina o suficiente para fortalecer homens e mulheres, dando amor aos sem amor, dignidade aos depravados e família aos refugiados. Mas o versículo de clímax fez com que meu louvor cessasse. Engasguei no meio do versículo:

Faz que a mulher estéril viva em família
e seja alegre mãe de filhos.
As cuidar da casa, ela encontra recompensa.
Jeová seja louvado; Aleluia!

Aquele salmo me incomodou muito, como uma dor de dente ruim. Seu ultrapassado endosso do patriarcado era impensável! Por décadas, eu vinha lutando contra o patriarcado. Sendo filha de uma feminista, assumia meu destino com orgulho. Mais ainda do que a minha identidade como lésbica, minha identidade feminista me ancorava em tudo o que eu valorizava. Eu não odiava homens. Tinha mulheres amigas que eram sexualmente parceiras de homens. Celebrava aquelas relações entre homens e mulheres que valorizavam a unidade, a interdependência e o serviço. E deplorava os relacionamentos entre homens e mulheres baseados na submissão da mulher, mesmo que voluntária. Minha visão de mundo/religião feminista declarava que qualquer relação sexual masculina e feminina que rejeitasse a unidade, a interdependência e o serviço, mas aprovasse a submissão da esposa era fundamental para a cultura de estupro. Aquilo que Deus chamou de bom, eu chamava de estupro.

O versículo inteiro era impensável. “Ao cuidar da casa, ela encontra recompensa”! Absurdo! Como alguém poderia encontrar recompensa ao cuidar da casa (ambicionando ser uma mãe e esposa em casa)? Imediatamente, pulei para a esperança de que poderia se tratar de apenas uma má tradução ou uma metáfora literária vívida—uma metáfora que seria necessário refrear. Por isto, perguntei à esposa do pastor. Então, perguntei às esposas dos presbíteros. E depois perguntei às outras mulheres da igreja.

Ninguém na minha igreja se desculpou por este versículo, e ninguém o descartou como uma metáfora em excesso.

Em vez disso, Floy e as outras mulheres às quais eu perguntei me disseram que este versículo era tanto metáfora quanto material. Tratava-se de mulheres reais refletindo seu relacionamento com Jesus por sua semelhança com Jesus. E dava uma imagem da compaixão de Deus para com a solitária. Minhas irmãs me relembraram que as Escrituras interpretam as Escrituras. O sentido, o propósito e a beleza deste versículo tinham que ser lidos no contexto de Gênesis 1.27 e Gênesis 3.16.

E assim, com a ajuda de irmãs mais velhas no Senhor, comecei a estudar estes textos. Li Gênesis 1.27 (“Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou.”). Contemplei a dignidade deste versículo: que tanto homens como mulheres derivam sua imagem de Deus, não um do outro. Pude ver quão limitada minha visão de mundo feminista era em relação à Palavra de Deus. A ordem da criação realçava a questão: os sexos são iguais em essência e diferentes no chamado. Tudo em meu corpo e cérebro gritava: ERRADO. Mesmo assim, um sussurro em meu coração ansiava por abrigo em Deus e pela aliança da igreja e da família.

Então minhas irmãs examinaram comigo Gênesis 3.16, a maldição de Deus sobre Eva: “E à mulher disse: Multiplicarei sobremodo os sofrimentos da tua gravidez; em meio de dores darás à luz filhos; o teu desejo será para o teu marido, e ele te governará”. Este versículo não foi fácil de destrinchar. Ficou mais fácil quando eu o li junto ao versículo paralelo em Gênesis 4.7: “eis que o pecado jaz à porta; o seu desejo será contra ti”, disse Deus a Caim, “mas a ti cumpre dominá-lo”. Os ecos literários expuseram como o pecado distorceu tudo—incluindo as relações entre maridos e esposas. Que a entrada do pecado no mundo produziu uma colisão de vontades dentro do casamento não é uma palavra de ordem feminista dos anos 1970. É uma interpretação lógica e óbvia daquilo que a depravação total revela sobre o meu coração. O pecado que Adão, nosso representante federativo, imputou a todos obstrui nossa vontade de fazer aquilo que Deus quer—tanto pessoal quanto em relacionamentos. E o que Deus deseja? Deseja que seus primeiros frutos—homens e mulheres—valorizem e triunfem sob sua ordenança de criação. Mesmo ao protestar veementemente contra o Salmo 113, uma parte profunda de mim reconhecia que a Palavra de Deus é boa—verdadeiramente singularmente boa. A Palavra de Deus é tão real quanto a chuva. E Sua Palavra deixa claro que a submissão de uma esposa no Senhor a seu marido piedoso faz parte da ordem da criação, gostasse eu ou não. (E eu não gostava).

O Salmo 113 fez mais do que me fazer refletir sobre a cultura. Levou-me a ver meu lesbianismo à luz das Escrituras. Para mim, o lesbianismo era minha identidade e minha preferência. Mas o lesbianismo à luz das Escrituras é uma rejeição aos homens em geral e à ordenança de criação em particular. Ao meditar no Salmo 113, considerei como meu pecado residente de homossexualidade estava firmemente entrelaçado com predisposições que, embora não pecaminosas em si mesmas, me eram bem úteis como lésbica. Eu exalava ousadia e força em vez de gentileza e bondade. É claro que os cristãos são chamados a serem ousados e fortes, mas a facilidade com que eu aplicava estes atributos havia se tornado algo como uma predisposição, uma predisposição para o pecado e não para a submissão. Mais uma vez, as irmãs no Senhor estiveram ao meu lado, lembrando-me que o fruto do Espírito reflete “amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio.” (Gl 5.22-23). Eu estava começando a ver que lutar contra o pecado da homossexualidade exigia aceitar a intenção de Deus para que eu vivesse todos os atributos do fruto do Espírito, não apenas aqueles que eram fáceis para mim. A condição de mulher piedosa começou a se parecer não como uma receita pré-fabricada, mas como uma aplicação específica da graça de Deus para mim, com a palavra da verdade moldando o barro do meu coração.

E assim foi que o Salmo 113 mudou minha vida. Olhei em seu espelho e vi o quão distante eu havia caído da vontade de Deus.

Mas, alguns anos mais tarde, o Salmo 113 mudou minha vida novamente.

Alguns anos após a minha conversão, o Senhor havia mudado as afeições do meu coração e me levado a acolher alegremente meu papel como mulher piedosa. Após derramar meu coração a Deus, implorando-lhe que me fizesse uma mulher piedosa, Ele me deu outro desejo: ser a mulher piedosa de um marido piedoso, submeter-me a ele como ajudante em sua obra, e, se Deus quisesse, ser mãe de nossos filhos. Anos repletos de conflitos e tumultos se seguiram, e então conheci Kent Butterfield. O Senhor juntou nossos corações e Kent propôs o casamento.

Quase imediatamente, o mundo forneceu três caminhos divergentes, três direções de vida opostas e três opções mutuamente exclusivas que me moldariam inequivocamente. Eu poderia voltar para a Syracuse University como professora catedrática de Inglês. Poderia ficar no Geneva College e candidatar-me a uma posição na liderança administrativa. Ou poderia casar com Kent Butterfield e tornar-me esposa de um plantador de igreja.

O primeiro caminho era familiar. O segundo caminho era reconhecível. O terceiro caminho era inimaginável.

Imediatamente, pessoas bem intencionadas—irmãos e irmãs cristãos—começaram a opinar. Como poderia uma mulher inteligente como eu se afastar da obra que o Senhor já havia preparado para mim? Não seria pecaminoso não usar meus dons? E quanto aos livros que eu nunca escreveria (presumivelmente)? Um irmão perguntou: “Por que você não pode ser professora, reitora ou presidente e Kent ser o pai que fica em casa?”. Outra irmã disse: “Você realmente precisa de um PhD para trocar fraldas?”.

O Senhor me levou a casar com Kent e tornar-me esposa de um plantador de igreja. Kent e eu estamos casados há 18 anos. O trabalho de Kent mudou de plantar igreja, para o trabalho secular, e depois para pastorear uma pequena igreja presbiteriana reformada. Incapaz de ter filhos próprios, o Senhor nos permitiu adotar quatro, dois por cuidado adotivo aos 17 anos de idade. Hoje, as idades dos meus filhos abrangem 13 a 31 anos. Passo meus dias ensinando meus dois filhos mais novos em casa, sendo uma ajudante de Kent, ensinando inglês no ensino médio em minha cooperativa de ensino em casa, e cuidando do meu neto de três anos nos fins de semana ou sempre que meu filho e nora precisam. Deus também me permitiu escrever livros e proclamar nosso poderoso e gracioso Deus a uma cultura hostil. Minhas mãos e coração estão cheios e transbordando.

O Salmo 113 me levou a dar uma volta completa. Há vinte e um anos, protestava veementemente contra o patriarcado, considerando qualquer tipo de submissão como violência e receita de abuso. Hoje, creio com todo o meu coração e mente que o único lugar seguro no mundo para uma mulher é como membro de uma igreja que crê na Bíblia, protegida e abrigada por Deus através de anciãos e pastores fiéis e, se Deus quiser, um marido piedoso. Uma alegria inimaginável está no centro da vontade de Deus. O Salmo 113 tem sido minha boa e fiel bússola em um mundo cheio de confusão sobre homens, mulheres e família.

As palavras inspiradas do Salmo 113 destinam-se a ser um unguento de conforto para os pobres e estéreis, com a conclamaçāo para louvarmos ao Senhor em toda e qualquer circunstância. Mas para os não convertidos, tais palavras são loucura e elas me fizeram naufragar completamente. E não posso louvar a Deus o suficiente por isso.

Originalmente publicado pelo 9Marks:  https://www.9marks.org/article/how-psalm-113-changed-my-life 

Traduzido por Raul Flores

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