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A necessidade de presbíteros nas igrejas

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O apóstolo Paulo instruiu Tito acerca das qualidades exigíveis aos presbíteros e da necessidade de bispos versados nas Escrituras.


Introdução

Conteúdo do artigo

Tito, gentio de origem grega, se converteu ao evangelho por intermédio do ministério evangelístico do apóstolo Paulo (Gálatas 2.3; Tito 1.4).

Por causa da questão levantada pelos judaizantes, que impunha a circuncisão aos cristãos gentios como necessária para se salvarem, Tito acompanhou o apóstolo Paulo e Barnabé a Jerusalém, quando os apóstolos e os anciões de Jerusalém realizaram um concílio para resolver a questão (Atos 15.6; Gálatas 2.1-30).

O apóstolo Paulo esperou encontrar Tito em Trôade, mas como não o encontrou, ficou muito preocupado (2 Coríntios 2.13).  O apóstolo Paulo foi a Macedônia, e por lá encontrou Tito (2 Coríntios 7.5-6).

O apóstolo Paulo relata aos cristãos de Corintos, na sua segunda carta, que ao chegar a Macedônia, Tito trouxe notícias dos cristãos de Coríntios, relatando as saudades, o choro e o zelo que tinham pelo apóstolo Paulo (2 Coríntios 7.7).

O apóstolo dos gentios relata aos cristãos de Corintos que os cristãos da Macedônia, apesar de paupérrimos, foram generosos ao contribuírem para com os cristãos em Jerusalém (2 Coríntios 8.1-2). Nesse diapasão, o apóstolo Paulo envia Tito, mais dois irmãos, aos cristãos de Coríntios para recolher a contribuição que fariam pelos cristãos pobres de Jerusalém (2 Coríntios 9.1-3).

Quando o apóstolo Paulo escreveu a epístola pastoral ao seu filho na fé, Tito estava na ilha de Creta com uma missão especifica: estabelecer líderes sobre as igrejas pelas cidades que passasse. No final da carta, o apóstolo promete enviar Ártemas (ou Tíquico) para substituir Tito em Creta, esperando que Tito pudesse se encontrar com o apóstolo Paulo em Nicópolis (Tito 3.12).

Ao escrever a Timóteo, o apóstolo Paulo deixou registrado a última cidade que temos conhecimento de que Tito esteve, a Dalmácia (atual Iugoslávia) (2 Timóteo 4.10).

Há diferenças significativas entre as epístolas pastorais e as epístolas gerais, como é o caso das duas cartas a Timóteo e a carta a Tito, se comparadas as cartas enviadas as igrejas, como: Romanos, Esios, Gálatas, Filipenses, Colossenses, etc., principalmente com relação a uma carta de conteúdo pessoal, como é o caso da carta a Filemom.

A diferença está nas formas como os temas doutrinários e as questões de convivência entres os cristãos são abordadas pelo apóstolo Paulo, isto decorre de dois motivos principais:

  1. À comunidade cristã o apóstolo Paulo faz uma defesa do evangelho e, aos pastores, dá-se orientação sobre o dever de defenderem o evangelho e o foco a ser trabalhado com a comunidade local;
  2. As comunidades cristãs eram compostas de neófitos, já as cartas pastorais visavam pessoas que conheciam bem todas as nuances do evangelho.

Uma das características das epístolas gerais é a abordagem argumentativa, ardente e emotiva do apóstolo Paulo quando defende algumas questões doutrinárias. As epístolas pastorais, além de instrutivas, são diretas e sem apelos.

Ao tratar com mestres, o vocabulário utilizado pelo escritor possui um leque maior, se comparado com o vocábulo utilizado para ensinar aprendizes e leigos. Com aprendizes não se deve utilizar uma gama muito grande de termos, tendo em vista que uma variante muito grande de termos pode ser um obstáculo à aprendizagem, diferentemente quando se trata com alguém que é experimentado na matéria.

Dizer que as cartas pastorais não foram escritas pelo apóstolo Paulo sob o argumento de que nelas sobeja ortodoxia e falta bases doutrinarias decorre da falta de sensibilidade em considerar o propósito das cartas e as características dos destinatários. Ao propor que os seus interlocutores (Timóteo e Tito) permanecessem firmes na ‘fé’, por serem mestres, o apóstolo Paulo não precisava explicar os rudimentos do evangelho, pois eles sabiam que Cristo é a fé manifesta (Gálatas 3.23-25), o firme fundamento dos apóstolos e profetas (Esios 2.20), e que por Jesus o homem tem certeza da salvação (coisas que se esperam), tornando-se agradável a Deus (Hebreus 11.1 e 6).

É pela capacidade de Timóteo e Tito que o apóstolo Paulo não precisava abordar questões como salvação, redenção, divindade de Cristo, justificação, santificação, graça, etc. A base do apóstolo Paulo para omitir tais questões decorre do seguinte princípio:

“POR isso, deixando os rudimentos da doutrina de Cristo, prossigamos até à perfeição, não lançando de novo o fundamento do arrependimento de obras mortas e de fé em Deus, e da doutrina dos batismos, e da imposição das mãos, e da ressurreição dos mortos, e do juízo eterno. E isto faremos, se Deus o permitir.” (Hebreus 6.1-3).

Ao escrever a Tito, dizendo: “TU, porém, fala o que convém à sã doutrina.” (Tito 2.1), percebe-se que Tito estava bem instruído na palavra da verdade, vez que, se o apóstolo Paulo tivesse que notificar os elementos que compõe a sã doutrina, teríamos que concluir que Tito era relapso ou um neófito.

Os presbíteros nas cidades

“Por esta causa te deixei em Creta, para que pusesses em boa ordem as coisas que ainda restam, e de cidade em cidade estabelecesses presbíteros, como já te mandei:” (Tito 1.5).

A recapitulação é uma característica indispensável em uma carta. Ser deixado em uma localidade, no caso concreto, significa que o apóstolo Paulo comissionou o seu filho na fé, Tito, ao estabelece-lo como liderança da comunidade cristã em Creta.

Quando o apóstolo Paulo deixou a ilha de Creta, ainda faltava concluir algumas questões, e Tito foi incumbido de organizar o que ainda restava, e quando partisse, de cidade em cidade deveria estabelecer presbíteros.

O termo grego πρεσβυτέρους[1] (presbuteros), traduzido por presbítero, ao ser utilizado à época pelo apóstolo Paulo não possuía a conotação que hoje atribuímos ao termo do ponto de vista de uma ordem eclesiástica.

O termo grego está associado a ideia de ‘homem velho’, ‘ancião’[2], vez que, nas sociedades antigas a liderança das assembleias era presidida por pessoas de maior idade, porém, não é essa a ideia que o apóstolo Paulo procurou evidenciar, que as comunidades cristãos precisavam de líderes de idade mais avançada.

O apóstolo dos gentios também não estava se apoiando nas regras judaicas ao estabelecer líderes: selecionar líderes entre os anciões. Semelhantemente, o apóstolo não tinha por base a ideia de que com os anciões é que estava o conhecimento ou a sabedoria, como bem aferiu Eliú (Jó 32.4-9).

Com o termo πρεσβυτέρους, o apóstolo só estava recomendando que se estabelecesse uma liderança, e a idade não era um quesito a se considerar, pois Timóteo é prova de que mesmo um jovem poderia ser esse líder. Embora o termo πρεσβυτέρους tenha no seu bojo a ideia de um líder ancião, com relação a comunidade cristã essa questão não deve ser levada em consideração.

Ninguém despreze a tua mocidade; mas sê o exemplo dos fiéis, na palavra, no trato, no amor, no espírito, na fé, na pureza.” (1 Timóteo 4.12).

O apóstolo já havia prescrito a Tito o dever de estabelecer líderes nas comunidades cristãs, e reitera essa ordem através dessa epístola.

Exigências para a posição de presbítero com relação a sociedade

“Aquele que for irrepreensível, marido de uma mulher, que tenha filhos fiéis, que não possam ser acusados de dissolução nem são desobedientes.” (Tito 1.6).

A escolha de um líder de uma comunidade local deveria recair sobre alguém livre de julgamento e/ou acusação moral. A irrepreensibilidade do presbítero é diferente da ‘irrepreensibilidade’ proporcionada através da eleição em Cristo.

Todos os que creem em Cristo conforme as Escrituras foram eleitos em Cristo para serem santos e irrepreensíveis, ou seja, sem condenação alguma diante de Deus (Romanos 8.1). A condenação decorrente da ofensa no Éden que pesava sobre todos os descendentes de Adão é extinta quando o homem crê no evangelho e morre com Cristo, de modo que, a nova criatura que ressurge juntamente com Cristo é santa e irrepreensível.

Os descendentes de Cristo, o último Adão, é a nova geração eleita para serem santos e irrepreensíveis em Cristo, isto porque são novas criaturas.

“Como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo, para que fôssemos santos e irrepreensíveis diante dele em amor;” (Esios 1.4);

“Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo.” (2 Coríntios 5.17).

Apesar na nova condição dos que creem ser santa e irrepreensível diante de Deus, isto não significa que o cristão está livre de julgamento ou acusação decorrente do seu comportamento na sociedade que está inserido. Um exemplo claro desta verdade vemos na pessoa do ladrão crucificado ao lado de Jesus, que ao reconhecer que Jesus é Senhor e possuidor de um reino que não era deste mundo, alcançou o direto de entrar no paraíso, porém, ainda estava sujeito à pena imposta pelas autoridades romanas.

Enquanto para ser irrepreensível diante de Deus basta crer em Cristo, condição própria à nova criatura, a irrepreensibilidade cobrada dos presbíteros depende do porte que adotar na sociedade.

Estes três versículos demonstram que a irrepreensibilidade em Cristo é concedida por Deus aos que creem em Cristo.

“O qual vos confirmará também até ao fim, para serdes irrepreensíveis no dia de nosso Senhor Jesus Cristo.” (1 Coríntios 1.8);

“E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso SENHOR Jesus Cristo.” (1 Tessalonicenses 5.23);

“Ora, àquele que é poderoso para vos guardar de tropeçar, e apresentar-vos irrepreensíveis, com alegria, perante a sua glória,” (Judas 1.24).

Estes versos, por sua vez, destacam qual deve ser o caráter exigido dos presbíteros:

“Vós e Deus sois testemunhas de quão santa, e justa, e irrepreensivelmente nos houvemos para convosco, os que crestes.” (1 Tessalonicenses 2.10);

Fazei todas as coisas sem murmurações nem contendas; Para que sejais irrepreensíveis e sinceros, filhos de Deus inculpáveis, no meio de uma geração corrompida e perversa, entre a qual resplandeceis como astros no mundo;” (Filipenses 2.14-15).

O apóstolo Paulo destaca que os cristãos de Tessalônica eram testemunhas de quão santa, justa e irrepreensível era o seu comportamento junto a eles. Semelhantemente, aos cristãos de Filipos, o apóstolo dos gentios recomendou que fizessem todas as coisas sem murmurações e sem contendas, para que fossem irrepreensíveis e sinceros. Quem murmura e contende não tem como ser sincero e livre de julgamento alheio.

Temos que saber divisar bem quem faz uma crítica construtiva de quem murmura, sendo que este é dissimulado, denigre e não edifica, enquanto aquele tem em vista um trabalho de excelência. Jetro, sogro de Moisés, fez uma crítica construtiva e apresentou uma solução a Moisés, que passava o dia julgando o povo, mas não estava dando conta (Êxodo 18.17). Coré, Datã e Abirão, por sua vez, se levantaram contra Moisés, e a crítica que eles fizeram acerca de Moisés era falsa (Números 16.13-14).

Esse deve ser o objetivo de quem preside uma comunidade cristã:

“Orai por nós, porque confiamos que temos boa consciência, como aqueles que em tudo querem portar-se honestamente.” (Hebreus 13.18).

É conveniente para o evangelho e a igreja que o cristão que vai assumir a função de presbítero seja irrepreensível, e por isso, se exige que o presbítero seja marido de uma única mulher. A exigência de uma só mulher se aplicava somente para quem fosse assumir a função de presbítero. Um membro da comunidade podia ter mais de uma mulher, mas aquele que fosse presidir uma comunidade cristã precisava ser marido de uma só mulher, visando um único quesito: ser irrepreensível diante da sociedade e da igreja de Deus.

O cristão deve ter em mente que o evangelho de Cristo não veio impor ou determinar costumes aos homens com relação a união conjugal.

O apóstolo Paulo ao tratar de questões relativas ao casamento, dependendo das circunstâncias envolvidas deixava bem claro que não havia mandamento de Deus, antes que a recomendação era um parecer do apóstolo.

“Mas aos outros digo eu, não o Senhor: Se algum irmão tem mulher descrente, e ela consente em habitar com ele, não a deixe.” (1 Coríntios 7.12).

Devido certas culturas, ao longo da história da humanidade sempre houveram uniões conjugais monogâmicas e poligâmicas. Inclusive, o patriarca Jacó adotou a poligamia, pois teve duas esposas: Lia e Raquel, filhas de Labão, e dessa união surgiu as doze tribos de Israel.

“E aconteceu que pela manhã, viu que era Lia; pelo que disse a Labão: Por que me fizeste isso? Não te tenho servido por Raquel? Por que então me enganaste? E disse Labão: Não se faz assim no nosso lugar, que a menor se dê antes da primogênita. Cumpre a semana desta; então te daremos também a outra, pelo serviço que ainda outros sete anos comigo servires.” (Gênesis 29.25-27).

No judaísmo, a poligamia foi proibida somente no século XI d.C., pelos rabinos, e ao rabino Gershom ben Judah é dado o crédito por essa proibição. Isto significa que, à época dos apóstolos, os judeus praticavam a poligamia.

À época dos apóstolos, uniões conjugais poligâmicas era pratica comum em diversos povos, e como o evangelho deve ser anunciado a todos os povos, nações e línguas, independentemente de questões culturais, não há qualquer impedimento quanto a anunciar o evangelho a alguém com mais de uma mulher, e nem há impedimento em essa pessoa se tornar cristã.

Ser crente em Cristo Jesus, ou em outras palavras, ser cristão, na essência do termo, é crer que Jesus Cristo de Nazaré é o enviado de Deus como salvador do mundo. Se crer conforme as Escrituras, que de antemão os profetas anunciaram que o Cristo havia de nascer na casa de Davi, e que a morte não teve poder sobre Ele, de modo que, ao ser morto, Deus O ressuscitou dentre os mortos, evidencia maior de que Jesus realmente é o Filho de Deus, essa pessoa será salva.

Para ser salvo em Cristo demanda obedecer ao mandamento de Deus: crer que Jesus é o Cristo, e não de questões circunstanciais como o casamento. Neste ponto, vale a recomendação paulina:

“E assim cada um ande como Deus lhe repartiu, cada um como o Senhor o chamou. É o que ordeno em todas as igrejas (…) Estás ligado à mulher? não busques separar-te. Estás livre de mulher? não busques mulher.” (1 Coríntios 7.17 e 27).

Se o cristão foi chamado estando casado, não importa se com uma ou mais mulheres, que permaneça como foi chamado: não busque se separar. Ora, se hoje um árabe casado com quatro mulheres resolver ser servo de Jesus Cristo, confessando-O como Senhor, não há qualquer impedimento quanto a servir a Cristo sendo marido de quatro esposas.

Se alguém anuncia que para ser servo de Cristo um árabe deve abandonar três das suas quatro mulheres, peca, pois não observa a verdade do evangelho, e se assemelha àqueles que anunciavam que os cristãos tinham que se circuncidarem segundo o rito de Moisés para se salvarem (Atos 15.1).

A exigência de uma só mulher se aplica aos que desejam exercer o presbitério, e não a todos os membros do corpo de Cristo.

“Convém, pois, que o bispo seja irrepreensível, marido de uma mulher, vigilante, sóbrio, honesto, hospitaleiro, apto para ensinar;” (1 Timóteo 3.2).

No Brasil, o que se exige? Ora, ser membro do corpo de Cristo não possui relação alguma com o ser brasileiro, antes, para ser membro do corpo de Cristo basta crer na doutrina do evangelho. Mas, como no Brasil está estabelecida a monogamia, todos os cristãos brasileiros, sem exceção, devem se sujeitar, neste quesito, às leis brasileiras. Não é porque é admissível um cristão árabe coabitar com mais de uma mulher, que o cristão brasileiro deva lançar mão dessa ‘prerrogativa’ dos árabes sob alegação de que é permitido aos cristãos ter mais de uma mulher.

Mas, por que o apóstolo Paulo colocou esse obstes a quem desejava ser bispo? Porque os romanos, os governantes do mundo à época, possuíam hábitos monogâmicos.  Por razões econômicas e político-administrativas, todos os povos sob domínio romano deviam adotar a monogamia, vez que a lei civil romana disciplinava todos os casamentos no império, não sendo admitido casamento poligâmico.

Como o evangelho de Cristo não estava preso aos domínios romanos, antes se estendia a todos os povos, não se exigia dos membros do corpo de Cristo a monogamia, entretanto, para se evitar que a liderança local de uma comunidade cristã fosse acusada de não sujeição as leis do estado romano, o presbítero tinha que ser marido de uma só mulher.

“Aquele que for irrepreensível, marido de uma mulher, que tenha filhos fiéis, que não possam ser acusados de dissolução nem são desobedientes.” (Tito 1.6).

Um presbítero que não fosse marido de uma só mulher e que não tivesse filhos fiéis[3] era passível de ser acusado perante o império (estado) de dissoluto ou insubordinado. O termo grego ἀνυπότακτος (anupotaktos) remete a ideia de insubmissão, não sujeito ao controle, desobediente, insubordinado, teimoso, e o termo ἀσωτία (asotia) remete a alguém inconveniente, de vida dissoluta, descontrolado, na prodigalidade.

Um presbítero sujeito às acusações de insubmissão e dissolução pelo estado traria grande prejuízo para a igreja de Cristo, vez que, por causa do comportamento de uma liderança local, se expunha ao vitupério o evangelho de Cristo, daí a obrigatoriedade de um bispo ter uma só mulher e filhos fiéis.

Temos que ter em mente que tanto a República quanto o Império romano abarcavam os domínios geográficos e políticos que antes fora dos gregos, hebreus, persas, babilônios, etc., entretanto, a proposta do evangelho tem por alvo todos os povos da terra, de modo que, não há para o evangelho de Cristo barreiras políticas, sociais, cultuais, econômicas ou linguísticas.

O apóstolo Paulo era cuidadoso com relação a doutrina do evangelho e procurava evitar que questões políticas ou sociais se tornassem entrave à divulgação do evangelho. Um exemplo desse cuidado se vê na orientação aos cristãos para se sujeitarem as autoridades, portanto, os cristãos não deviam se envolver nas sedições dos judeus, de modo que a perseguição aos judeus por questões políticas também alcançasse ou afetasse os cristãos, cuja pretensão é somente anunciar Cristo como salvador do mundo (Romanos 13.1-7).

O apóstolo Pedro é mais contundente ao escrever aos cristãos convertidos dentre os judeus que, por amor a Deus, se sujeitassem as autoridades constituídas:

“Amados, peço-vos, como a peregrinos e forasteiros, que vos abstenhais das concupiscências carnais que combatem contra a alma; Tendo o vosso viver honesto entre os gentios; para que, naquilo em que falam mal de vós, como de malfeitores, glorifiquem a Deus no dia da visitação, pelas boas obras que em vós observem. Sujeitai-vos, pois, a toda a ordenação humana por amor do Senhor; quer ao rei, como superior; Quer aos governadores, como por ele enviados para castigo dos malfeitores, e para louvor dos que fazem o bem.” (1 Pedro 2:11-14).

“Mas principalmente aqueles que segundo a carne andam em concupiscências de imundícia, e desprezam as autoridades; atrevidos, obstinados, não receando blasfemar das dignidades;” (2 Pedro 2.10).

Se os apóstolos tivessem alinhado politicamente os primeiros cristãos aos anseios políticos dos judeus do primeiro século, a repressão política dos Romanos também poderia ter se estendido aos cristãos. Conforme os relatos dos Evangelhos e do Livro dos Atos dos Apóstolos, os cristãos foram perseguidos pelos judeus por questões político-religiosas, e Saulo é um exemplo claro da perseguição dos líderes judaicos aos cristãos, com anuência de Roma, sob pretexto de serem uma seita dissidente do judaísmo.

“E pediu-lhe cartas para Damasco, para as sinagogas, a fim de que, se encontrasse alguns daquela seita, quer homens quer mulheres, os conduzisse presos a Jerusalém.” (Atos 9.2);

“Como também o sumo sacerdote me é testemunha, e todo o conselho dos anciãos. E, recebendo destes cartas para os irmãos, fui a Damasco, para trazer maniatados para Jerusalém aqueles que ali estivessem, a fim de que fossem castigados.” (Atos 22.5);

“E, logo que chegamos a Roma, o centurião entregou os presos ao capitão da guarda; mas a Paulo se lhe permitiu morar por sua conta à parte, com o soldado que o guardava. E aconteceu que, três dias depois, Paulo convocou os principais dos judeus e, juntos eles, lhes disse: Homens irmãos, não havendo eu feito nada contra o povo, ou contra os ritos paternos, vim contudo preso desde Jerusalém, entregue nas mãos dos romanos; Os quais, havendo-me examinado, queriam soltar-me, por não haver em mim crime algum de morte. Mas, opondo-se os judeus, foi-me forçoso apelar para César, não tendo, contudo, de que acusar a minha nação. Por esta causa vos chamei, para vos ver e falar; porque pela esperança de Israel estou com esta cadeia. Então eles lhe disseram: Nós não recebemos acerca de ti carta alguma da Judeia, nem veio aqui algum dos irmãos, que nos anunciasse ou dissesse de ti mal algum.” (Atos 28.16-21).

Com relação aos filhos dos presbíteros, o que se exige é que sejam verdadeiros nos negócios, na obediência aos deveres sociais e nas obrigações impostas pelo estado. A leitura de que o presbítero deva ter filhos cristãos é equivocada, pois cada um dará conta de si mesmo a Deus, e não os pais. Os presbíteros devem ter filhos educados que se sujeites as leis e costumes da sociedade que estão inseridos.

Se um presbítero tivesse filhos envolvidos em sedições, revoltas, criminalidade, etc., comprometeriam a imagem dos cristãos na sociedade, o que poderia desencadear perseguições ao evangelho, como se o evangelho fosse a causa provável de um grupo de pessoas não se sujeitarem ao estado.

Após apontar qual deve ser o comportamento do presbítero com relação a sociedade, o apóstolo Paulo se volta às questões próprias a igreja de Deus.

Exigências para a escolha de alguém para o presbitério

“Porque convém que o bispo seja irrepreensível, como despenseiro da casa de Deus, não soberbo, nem iracundo, nem dado ao vinho, nem espancador, nem cobiçoso de torpe ganância;” (Tito 1.7).

O termo grego ἐπίσκοπος[4] (episkopos) remete a função dos presbíteros nas Igrejas. Ao líder incumbe supervisionar, de modo que um presbítero é um bispo.

O termo grego δει (dei) traduzido por ‘conveniente’, com relação ao bispo, demonstra ‘que é necessário, que há a necessidade de, que convém, que é correto e próprio’ ao bispo ser livre de acusações. E, por que se exige esse qualificativo de um bispo? Porque o bispo é despenseiro[5] da casa de Deus!

Todos os cristãos são despenseiros da multiforme graça (mistérios) de Deus que há no evangelho, já o bispo, além de despenseiro da multiforme graça, lhe compete supervisionar os membros do corpo de Cristo, e por isso, as exigências são maiores.

Cada um administre aos outros o dom como o recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus.” (1 Pedro 4.10);

“QUE os homens nos considerem como ministros de Cristo, e despenseiros dos mistérios de Deus. Além disso, requer-se dos despenseiros que cada um se ache fiel.” (1 Coríntios 4.1-2).

O bispo não pode ser soberbo, tradução do termo grego αὐθάδης (authadés), no sentido de orgulhoso, teimoso, obstinado, arrogante. Considerando essa característica, caso o apóstolo Pedro fosse orgulhoso, não aceitaria a repreensão do apóstolo Paulo feita na presença de todos quando se fez repreensível, o que resultaria em prejuízo irreparável ao evangelho de Cristo (Gálatas 2.14).

O bispo não pode ser iracundo, tradução do termo grego ὀργίλος (orgilos), empregado para descrever alguém inclinado a ira, irascível, furioso, colérico. Tito deveria analisar o temperamento do futuro bispo, e caso se verificasse certa propensão à cólera, a escolha devia ser vetada.

O apóstolo Paulo elenca primeiro uma atitude moralmente reprovável: o orgulho, e em segundo lugar destaca um temperamento reprovável: a cólera. Em seguida, destaca a falta de controle com o vinho. Jamais um bêbado deveria ser escolhido para a função de bispo, e o termo grego utilizado pelo apóstolo é πάροινος (paroinos), que descreve alguém dado ao vinho, uma pessoa que vive embriagada.

A temática da proibição quanto a escolha de um bispo dado ao vinho não se confunde com o alerta feito aos cristãos em Éfeso, que diz:

“E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito;” (Esios 5.18).

Aos cristãos em Éfeso, o apóstolo determina que não se intoxiquem[6], ou que não se embriaguem. Mas, não deviam se embriagar com o que? A resposta é clara: com vinho no qual há uma vida de devassidão[7], desenfreada, de prodigalidade. Se faz necessário considerar o termo utilizado para vinho, que é οἶνος[8] (oinos), uma palavra primária ou de origem hebraica, e que não se utiliza para fazer referência ao vinho proveniente da fermentação da uva, pois diz de um vinho que provoca prodigalidade, o que nos remete ao vinho da ira colhido nos campos das vinhas de Sodoma e Gomorra.

“Porque a sua vinha é a vinha de Sodoma e dos campos de Gomorra; as suas uvas são uvas venenosas, cachos amargos têm. O seu vinho é ardente veneno de serpentes, e peçonha cruel de víboras.” (Deuteronômio 32.32-33).

Através do contexto, verifica-se que o espírito é contraponto ao vinho, sendo que este faz referência a doutrina dos judaizantes, e aquele à doutrina de Cristo. Quem se deixar enganar com palavras vãs se embriaga no vinho que há devassidão (Esios 5.5). Qualquer cristão, não importa se líder ou membro, não pode ser participante do vinho que há devassidão, pois esse é o vinho dos judaizantes (Esios 5.7 e 11).

O ‘vinho’ que é vetado a todos os cristãos é o vinho que atordoava e fez os filhos de Israel titubear.

“Tardai, e maravilhai-vos, folgai, e clamai; bêbados estão, mas não de vinho, andam titubeando, mas não de bebida forte.” (Isaías 29.9).

Retornando a análise da epístola a Tito, o apóstolo Paulo não estava vetando terminantemente aos bispos os produtos derivados da fermentação do produto da videira quando estipulou que eles não podiam ser dados ao vinho. O presbítero só não podia ser um beberão inveterado, ou seja, alguém que se bebesse do produto fermentado da vide perdesse o juízo.

Através desta análise do texto, quero deixar claro que, como interprete das Escrituras, não estou liberando o uso de bebida alcoólica aos cristãos. Essa é uma questão que o cristão deve consultar o seu bispo ou deliberar juntamente com os demais congregados, e o que for decidido pelos congregados, ou pela liderança, que seja acatado por todos.

O que é necessário ficar bem claro, é que o apóstolo Paulo não vetou o uso de bebida alcoólica aos cristãos, antes disciplinou que os bispos não podem ser dados ao vinho, ou seja, não podiam ser beberão. Vetar a bebida alcoólica, quer seja fermentada ou destilada, a pretexto de que a bebida com teor alcoólico afasta o homem de Deus, ou que contamina o homem, é falácia que tem que ser combatida.

Inclusive, o apóstolo Paulo recomendou a Timóteo o uso de um pouco de vinho devido a uma enfermidade que o seu filho na fé tinha no estomago.

“Não bebas mais água só, mas usa de um pouco de vinho, por causa do teu estômago e das tuas frequentes enfermidades.” (1 Timóteo 5.23).

Beber vinho, ou qualquer outra bebida alcoólica (fermentada ou destilada) não é pecado, mas o beber ou comer com escândalo vai mal para o cristão.

“Não destruas por causa da comida a obra de Deus. É verdade que tudo é limpo, mas mal vai para o homem que come com escândalo. Bom é não comer carne, nem beber vinho, nem fazer outras coisas em que teu irmão tropece, ou se escandalize, ou se enfraqueça.” (Romanos 14.20-21);

“Mas vede que essa liberdade não seja de alguma maneira escândalo para os fracos.” (1 Coríntios 8.9).

Da orientação paulina a Tito, temos que, enquanto os membros da igreja podiam fazer uso do vinho, ao bispo havia uma restrição: não podia ser dado ao vinho.

Outra característica vetada ao bispo é ser briguento, contencioso. O termo utilizado é πληκτης (plektes), que se aplica a alguém brigão, pronto para desferir um golpe, pugnaz. Diz de alguém que não aceita ser contraditado, antes gosta do contencioso, se envolvendo em brigas, e por isso, não serve para exercer o presbitério.

A última característica que um bispo não pode ter é a ganancia. O termo grego utilizado é αισχροκεδ (aischrokerdes), que descreve alguém ávido pelo lucro, ganancioso por dinheiro. O motivo de vetar alguém ganancioso é claro:

“Mas os que querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína. Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores.” (1 Timóteo 6.10).

A ganancia é cobiça que faz o cristão se desviar do evangelho, pois está sujeito a cair em tentações, laços, e se deixar conduzir por concupiscências loucas e nocivas. Sem falar que, quem quer ser rico, se deixa levar pelo trabalho excessivo, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores, a penalidade decorrente da maldição imposta ao homem que come do suor do rosto e a terra que produz cardos e abrolhos.

“E a Adão disse: Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os dias da tua vida. Espinhos, e cardos também, te produzirá; e comerás a erva do campo. No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás.” (Gênesis 3.17-19).

Qualidades de um presbítero

“Mas dado à hospitalidade, amigo do bem, moderado, justo, santo, temperante; Retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina, como para convencer os contradizentes.” (Tito 1.8-9).

O termo grego φιλόξενος[9] (philoxenos), traduzido por hospitaleiro, considerando as peculiaridades da sociedade à época, evoca a ideia de quem preservava as tradições de recepcionarem os viajantes. O hospitaleiro à época era alguém que cumpria a exigência do ágape[10], ou seja, de receber bem os viajantes, visto que, receber e assistir um viajante à época era uma questão de vida ou morte para quem necessitava de assistência.

Ser hospitaleiro à época não era somente ser generoso, uma questão de cunho subjetivo, antes envolvia um dever objetivo, de dar abrigo aos viajantes. O que o homem do nosso tempo vê como gentileza, deferência, o homem da antiguidade tinha como obrigação, daí emana a essência do termo grego αγαπη (ágape) quando empregado pelos apóstolos no Novo Testamento.

O presbítero deve ser um amigo do bem, tradução do adjetivo φιλάγαθος, que em essência é ser amigo do que é virtuoso, apegado ao que é de natureza superior (nobre).

Um bispo tem que ser moderado[11], ou seja, equilibrado em suas ações e considerações acerca das questões socioeconômicas e culturais. Uma mente sã sem radicalismo ou extremismo frente a diversidade cultural que o mundo apresenta. Esse equilibro deve abranger impulsos e anseios pessoais, de modo que a moderação é a marca do comportamento do bispo.

“Não dado ao vinho, não espancador, não cobiçoso de torpe ganância, mas moderado, não contencioso, não avarento;” (1 Timóteo 3.3).

Outra virtude do bispo é ser justo[12]. Essa virtude não pode ser confundida com a condição própria à nova criatura, que é criada segundo Deus em verdadeira justiça e santidade. É uma virtude de alguém que trata o outro com dignidade e observa as leis que regem o estado.

O ladrão na cruz não era alguém que obedecia às leis, porém, ao crer que Jesus tinha um reino, foi justificado e apto a herdar o paraíso. Embora não fosse justo diante dos homens, foi criado de novo justo diante de Deus. Embora justo diante de Deus, o ladrão da cruz não dispunha de uma característica exigível a um bispo.

De igual modo, o bispo tinha que ser santo[13], ou seja, que no dia a dia observa suas obrigações sociais de modo impecável. Da mesma forma que a virtude de justo, santo neste contexto não se refere à condição da nova criatura, que ao ser criada de novo é livre do pecado.

Antes de ser bispo, primeiro é necessário crer que Jesus é o Cristo. Quando se converte a Cristo, ocorre o descrito pelo apóstolo Paulo:

“E é o que alguns têm sido; mas haveis sido lavados, mas haveis sido santificados, mas haveis sido justificados em nome do Senhor Jesus, e pelo Espírito do nosso Deus.” (1 Coríntios 6.11).

Os salvos em Cristo foram lavados, santificados e justificados por Cristo, e por isso são denominados justos e santos. Agora, além da nova condição em Cristo, se exige dos presbíteros qualidades nobres conforme é retratado na literatura grega clássica acerca do que se deve respeito.

Lembrando que os termos traduzidos por ‘justo’ e ‘santo’ possuíam significados específicos dentro da literatura grega classifica, e foram utilizados por Platão, Políbio, Ésquilo, Sófocles, etc., porém, jamais poderiam utilizar os termos segundo a revelação do evangelho, sendo que, no Novo Testamento, estes termos descrevem a condição do novo homem gerado segundo Deus, mas, também são utilizados para descrever as qualidades de caráter e moral de qualquer indivíduo, sendo cristão ou não.

O apostolo Paulo também aponta a ‘temperança’[14] como qualidade exigível ao bispo. Essa qualidade diz de quem exerce domínio sobre as suas emoções, que controla os seus anseios pessoais, que modera as suas ações, restringindo a si mesmo. Só é temperante quem possui todas virtude elencadas anteriormente.

“Não dado ao vinho, não espancador, não cobiçoso de torpe ganância, mas moderado, não contencioso, não avarento;” (1 Timóteo 3.3).

A última questão exigível ao presbítero, e a mais importante para o pleno exercício do ministério, é se manter em posse do evangelho. O termo grego traduzido por ‘reter’[15] é ἀντέχομαι, e remete a ‘prestar atenção cuidadosa’, ‘manter-se apegado’, ‘estar de posse plena’.

Sobre essa caraterística do bispo, vemos o apóstolo Paulo testemunhando a Timóteo que combateu um bom combate e, apesar de findar a carreira, estava de posse do evangelho: a fé que uma vez foi dada aos santos.

“Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé.” (2 Timóteo 4.7).

O presbítero deve reter e lutar pelo que? Tem o dever de reter e lutar pelo ensino, pela doutrina, pela fé, ou seja, a διδαχή[16] (didaqué). Não se trata de qualquer ensino ou doutrina, e sim, da doutrina que é de acordo com a palavra fiel, verdadeira.

Um bispo que guarda a fiel palavra é capaz[17] de:

  1. capacitado a admoestar (instruir, ensinar, exortar) com a fiel doutrina, e;
  2. convencer os contradizentes.

O apóstolo Paulo não recomendou escolher bispos que fossem nobres, cheios de posses, autoridades do estado, mestres de instituições de ensino seculares, comerciantes, latifundiários, etc. O que mais se vê em nossos dias são líderes eclesiásticos escolhendo bispos por serem empresários, possuírem diplomas seculares, artistas renomados, esportistas bem-sucedidos, etc., o que não é bom para o evangelho e nem para a comunidade local.

Como alguém pode reter o evangelho se não o conhece? Como ter cuidado de si mesmo e da doutrina? Quem não tem a doutrina, jamais se salvará e nem salvará aqueles que o ouvem.

“Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem.” (1 Timóteo 4.16).

A necessidade de presbíteros instruídos

“Porque há muitos desordenados, faladores, vãos e enganadores, principalmente os da circuncisão, aos quais convém tapar a boca; homens que transtornam casas inteiras ensinando o que não convém, por torpe ganância.” (Tito 1.10-11).

A necessidade de presbíteros se dá porque havia muitos homens desordenados. O termo grego traduzido por desordenados[18] é ἀνυπότακτος, que remete a uma pessoa indisciplinada, desobediente, insubmisso.

O adjetivo ἀνυπότακτος é melhor traduzido no texto por ‘desobediente’, do que por desordenado. Um desordenado remete o leitor às questões de caráter e moralidade, sendo que o contexto remete a quem é avesso ou que não obedece ao evangelho, em especial, os da circuncisão.

“Mas a indignação e a ira aos que são contenciosos, desobedientes à verdade e obedientes à iniquidade;” (Romanos 2:8);

“Assim também estes agora foram desobedientes, para também alcançarem misericórdia pela misericórdia a vós demonstrada.” (Romanos 11.31);

“Confessam que conhecem a Deus, mas negam-no com as obras, sendo abomináveis, e desobedientes, e reprovados para toda a boa obra.” (Tito 1.16);

“E uma pedra de tropeço e rocha de escândalo, para aqueles que tropeçam na palavra, sendo desobedientes; para o que também foram destinados.” (1 Pedro 2.8).

A necessidade de presbíteros está diretamente atrelada a existência dos ‘desobedientes’, que são apresentados como muitos. Embora todos não cristãos sejam desobedientes pela ignorância, os da circuncisão são assim designados por causa dos profetas.

Rebeldes fostes contra o SENHOR desde o dia em que vos conheci.” (Deuteronômio 9.24);

“E não fossem como seus pais, geração contumaz e rebelde, geração que não regeu o seu coração, e cujo espírito não foi fiel a Deus.” (Salmos 78.8);

“Estendi as minhas mãos o dia todo a um povo rebelde, que anda por caminho, que não é bom, após os seus pensamentos;” (Isaías 65.2).

Os tradutores e interpretes geralmente buscam um viés moralizante, e querem destacar virtudes em contraponto com os vícios da humanidade, no entanto, o apóstolo dos gentios estava preocupado com a oposição dos judaizantes, pois a doutrina desses religiosos era um grande perigo para o evangelho.

A imoralidade dos romanos, ou a licenciosidade dos gregos, ou a violência dos bárbaros, etc., não era um risco para o evangelho. O risco estava em que, assim como Isaque foi perseguido por Ismael, a doutrina do evangelho estava sendo perseguida pelos judaizantes, daí a necessidade dos presbíteros, líderes locais que manejassem bem a palavra da verdade.

“Os quais também mataram o SENHOR Jesus e os seus próprios profetas, e nos têm perseguido; e não agradam a Deus, e são contrários a todos os homens,” (1 Tessalonicenses 2.15);

“Mas, como então aquele que era gerado segundo a carne perseguia o que o era segundo o Espírito, assim é também agora.” (Gálatas 4.29).

“Mas os judeus desobedientes, movidos de inveja, tomaram consigo alguns homens perversos, dentre os vadios e, ajuntando o povo, alvoroçaram a cidade, e assaltando a casa de Jasom, procuravam trazê-los para junto do povo.” (Atos 17.5).

Ao ler as Escrituras, se faz necessário considerar que o cristão não deve ter comunhão com aqueles que se dizem cristãos e são devassos, e não que os cristãos devam se segregar dos não cristãos.

“Não é boa a vossa jactância. Não sabeis que um pouco de fermento faz levedar toda a massa? Alimpai-vos, pois, do fermento velho, para que sejais uma nova massa, assim como estais sem fermento. Porque Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por nós. Por isso façamos a festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da maldade e da malícia, mas com os ázimos da sinceridade e da verdade. Já por carta vos tenho escrito, que não vos associeis com os que se prostituem; Isto não quer dizer absolutamente com os devassos deste mundo, ou com os avarentos, ou com os roubadores, ou com os idólatras; porque então vos seria necessário sair do mundo. Mas agora vos escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais.” (1 Coríntios 5.6-10)

De um cristão é exigido um bom porte na sociedade, mas a temática da doutrina de Cristo não tem cunho moralizante. A essência do evangelho não é a moralidade. O homem não precisa ser salvo moralmente, antes precisa ser salvo da condenação decorrente da ofensa de Adão.

Do presbítero é exigido um comportamento impecável por causa da função que exercerá sobre a casa de Deus, pois combaterá homens ‘desobedientes’, mas que aos olhos da sociedade parecem justos.

“Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas interiormente estais cheios de hipocrisia e de iniquidade.” (Mateus 23.28);

“O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano.” (Lucas 18.11).

Um fariseu não matava, não roubava, não se prostituía, etc., portanto, a questão a ser combatida não era moral e nem comportamental, antes era a doutrina que continha o ‘fermento dos fariseus’. Combate-se o ‘fermento dos fariseus’ com os ‘ázimos da sinceridade’, ou seja, evangelho versus doutrina dos fariseus, e não as questões comportamentais.

Exemplificando, temos a prática de lavar as mãos. Fica a pergunta: a prática judaica de lavar as mãos deve ser combatida pelos cristãos? Depende. Do ponto de vista sanitário, lavar às mãos é uma ótima prática, e deve ser incentivada. Mas, do ponto de vista da religiosidade judaica, deve ser combatida, pois lavar às mãos não purifica ninguém.

“São estas coisas que contaminam o homem; mas comer sem lavar as mãos, isso não contamina o homem.” (Mateus 15.20);

“Porque os fariseus, e todos os judeus, conservando a tradição dos antigos, não comem sem lavar as mãos muitas vezes;” (Marcos 7.3).

O bispo da igreja deveria ter conhecimento suficiente para saber instruir a igreja local sobre essas questões, sabendo que o que foi instituído na lei acerca da purificação com água limpa era sombra, visto que, a realidade está em Cristo. Cada cristão estava limpo pelas palavras que Cristo falou, de modo que a tradição dos antigos não devia ser conservada entre os membros do corpo de Cristo. Mas, por questões sanitárias, não há problema algum os cristãos lavarem às mãos antes das refeições.

A necessidade de bispos se dava em razão dos desobedientes e faladores[19]. O termo grego traduzido por ‘faladores’ é ματαιολόγος, predicativo que se amolda a alguém que que faz uso de ardis, cheio de astúcias.

“Antes, rejeitamos as coisas que por vergonha se ocultam, não andando com astúcia nem falsificando a palavra de Deus; e assim nos recomendamos à consciência de todo o homem, na presença de Deus, pela manifestação da verdade.” (2 Coríntios 4.2);

“Mas temo que, assim como a serpente enganou Eva com a sua astúcia, assim também sejam de alguma sorte corrompidos os vossos sentidos, e se apartem da simplicidade que há em Cristo.” (2 Coríntios 11.3);

Seguramente a serpente morderá antes de estar encantada, e o falador não é melhor.” (Eclesiastes 10.11).

“Porque a sabedoria deste mundo é loucura diante de Deus; pois está escrito: Ele apanha os sábios na sua própria astúcia.”  (1 Coríntios 3.19).

Os sábios e a sabedoria destacada pelo apóstolo Paulo dizem dos judaizantes e da doutrina judaica, pois os judeus têm (consideram) a lei como ciência (sabedoria) e verdade (Romanos 2.20). Observe que o evangelho não se contrapõe à ciência acadêmica, que envolve o desenvolvimento cientifico e tecnológico, e sim, ao saber (sabedoria, ciência) religioso que os judeus, por tradição, receberam dos seus pais.

Os faladores são especificamente aqueles que posam de mestres da lei, mas que não compreendem o que dizem e nem o que afirmam.

“Querendo ser mestres da lei, e não entendendo nem o que dizem nem o que afirmam.” (1 Timóteo 1.7).

Os judaizantes são classificados como ‘enganadores’[20], tradução do termo φρεναπάτης, que remete a alguém sedutor, impostor capaz de fascinar os seus ouvintes. Vê-se a capacidade de sedução dos enganadores na carta do apóstolo aos Gálatas:

“Ó INSENSATOS gálatas! quem vos fascinou para não obedecerdes à verdade, a vós, perante os olhos de quem Jesus Cristo foi evidenciado, crucificado, entre vós?” (Gálatas 3.1).

Quem se sobressaia na desobediência, falatório e na sedução? Os da circuncisão. Os judaizantes eram um problema, mas os da circuncisão eram piores, pois anunciavam que os cristãos para se salvar precisavam se circuncidar segundo o rito de Moisés.

“ENTÃO alguns que tinham descido da Judeia ensinavam assim os irmãos: Se não vos circuncidardes conforme o uso de Moisés, não podeis salvar-vos.” (Atos 15.1);

“Estes são manchas em vossas festas de amor, banqueteando-se convosco, e apascentando-se a si mesmos sem temor; são nuvens sem água, levadas pelos ventos de uma para outra parte; são como árvores murchas, infrutíferas, duas vezes mortas, desarraigadas;” (Judas 1.12).

Os judaizantes se opunham completamente ao evangelho, já os da circuncisão queriam deitar remendo de pano novo em roupa velha, ou colocar vinho velho e odres novos. Com relação aos da circuncisão fica o alerta aos cristãos: um pouquinho de fermento leveda toda massa!

“Ninguém deita remendo de pano novo em roupa velha, porque semelhante remendo rompe a roupa, e faz-se maior a rotura. Nem se deita vinho novo em odres velhos; aliás rompem-se os odres, e entorna-se o vinho, e os odres estragam-se; mas deita-se vinho novo em odres novos, e assim ambos se conservam.” (Mateus 9.16-17).

Os presbíteros são necessários para fazer os desobedientes, os faladores e os sedutores, e principalmente, os que apregoam a circuncisão, calarem a boca. São os que apregoam a circuncisão que transtornam famílias inteiras ensinando o que é inconveniente. Como a matéria que está sendo defendida é o evangelho, o inconveniente, o incorreto, diz do ensinado por tais doutrinadores, pois eles corrompem a essência do evangelho. Como são ávidos para ganharem ‘seguidores’, são extremamente baixos, sem qualquer resquício de honradez (Mateus 23.15).

Os cretenses são sempre mentirosos

Após expor os motivos pelos quais Tito foi deixado em Creta:

  1. a) colocar em boa ordem as coisas que restavam, e;
  2. b) constituir presbíteros (v. 5).

O apóstolo Paulo deixa de tratar das características exigíveis aos bispos e de descrever o perigo que representava os judaizantes, principalmente os da circuncisão, e volta a destacar questões próprias ao povo de Creta, a ilha grega na qual Tito estava.

“Um deles, seu próprio profeta, disse: Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins, ventres preguiçosos. Este testemunho é verdadeiro. Portanto, repreende-os severamente, para que sejam sãos na fé.” (Tito 1.12-13).

É imprescindível considerar que:

  1. O texto em análise se trata de uma epístola direcionada a uma única pessoa, Tito, um grego convertido ao cristianismo;
  2. O público de uma carta é restrito, portanto, completamente diferente de um livro didático, de poesia ou de um veículo de notícia, ou seja, não contém definições, não apresenta os rudimentos de uma matéria e o seu desenvolvimento, somente comunica uma ideia;
  3. Uma carta parte do pressuposto de que há um conhecimento comum tanto ao emissor quanto ao destinatário e, nesse sentido, temos o apóstolo Paulo, um cidadão Romano e Judeu, amigo de um grego, porém, ambos comungavam da doutrina de Cristo (conhecimento comum), lembranças, fatos, etc., elementos que influenciaram a linguagem e o modo de se comunicarem.

É por isso que o apóstolo Paulo não cita quem dentre os cretenses afirmou acerca deles mesmos que eles eram mentirosos e bestas ruins. Atribuir tal citação a Epimênides não passa de especulação sem fundamento verificável, nem na epístola em análise, nem nos textos seculares.

Em um verso da Teogonia de Hesíodo, tem-se uma fala que alguns estudiosos correlacionam à citação paulina:

“Elas um dia a Hesíodo ensinaram belo canto

quando pastoreava ovelhas ao pé do Hélicon divino.

Esta palavra primeiro disseram-me as Deusas

Musas olimpíades, virgens de Zeus porta-égide:

Pastores agrestes, vis infâmias e ventres só,

sabemos muitas mentiras dizer símeis aos fatos

e sabemos, se queremos, dar a ouvir revelações’” Hesíodo, Teogonia.

Na ‘Origem dos deuses gregos’, Hesíodo narra que, enquanto pastoreava ovelhas, as Musas lhe dirigiram a palavra, evidenciando:

  1. a) a função de pastoreio que Hesíodo exercia;
  2. b) a origem do poeta como inferior, no sentido de ralé, vil, contrastando a natureza das Musas com a natureza humana do poeta, e;
  3. c) a razão da existência dos homens, que se resume em trabalhar para satisfazer o próprio ventre.

A tradução italiana de Arrighetti, reza: “pastores, cujo campo é casa, má gente, só ventre”, ao que se deduz que um pastor reside no campo, mas não se deve concluir que quem lida com ovelhas são pessoas maldosas, e sim, de origem baixa, como se observa:

“O mesmo ocorre com a nobreza. Consideram-na dos povos cultivados como pura e existente em toda a parte; a dos povos bárbaros, como local e boa, somente para eles. Distinguem o homem livre do escravo, a nobreza do vulgo, pelas vantagens e vícios de nascimento. Como diz a Helena de Teodecto: Escrava, eu? Que homem tão audacioso poderia chamar assim uma filha dos deuses. Os que partilham desta opinião não diferenciam o escravo do homem livre, o nobre do plebeu, senão pela distância entre o vício e a virtude; e, como o homem vem do homem e o animal do animal, acham que o bom só pode vir do bom.” Aristóteles, A Política < http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/marcos/hdh_aristoteles_a_politica.pdf > Consulta realizada em 07/07/18.

Para os gregos, como o homem só é proveniente de outro homem, os nobres descendiam somente dos nobres, ou seja, dos bons, dos bem-nascidos.

A oração: ‘Os cretenses são sempre mentirosos’, encontra-se no Hino a Zeus, escrito por Calímaco de Cirene (III a.C.), que após destacar que havia uma disputa sobre qual monte Zeus nasceu, afirmou que os cretenses mentiam sobre a morte de Zeus:

“Que outra coisa seria mais desejável cantar durante as libações

de Zeus do que o próprio deus, sempre grande, sempre soberano,

condutor dos Pelógones, juiz dos Urânidas?

E como o cantaremos, Dicteu ou Liceu?

Muito em dúvida está o ânimo, já que o nascimento é disputado.

Zeus, dizem que tu nasceste nos Montes Ideus,

Zeus, dizem que, a Arcádia; quais deles, pai, mentem?

Os Cretenses são sempre mentirosos’, pois um túmulo, ó senhor,

Os cretenses construíram para ti; tu não morreste, pois sempre existirás”

Da mesma forma que o apóstolo dos gentios, Calímaco também não nomeia Epimênides como o cretense que disse ‘os cretenses são mentirosos’. Mas, analisando o contexto do Hino de Calímaco, verifica-se que ele não aponta a mentira como um vício intrínseco aos cretenses, mas que, pelo fato de terem edificado um túmulo a Zeus, pelos demais gregos os cretenses eram tidos por mentirosos. Enquanto com relação ao monte onde Zeus nasceu havia dúvidas sobre quem mentia, com relação aos cretenses, por terem edificado um túmulo a Zeus, certo era para Calímaco que eram mentirosos.

A lápide que os cretenses erigiram em memória a Zeus, na visão de Calímaco era um testemunho em desfavor dos cretenses, dado a sua crença de que Zeus era um imortal.

Muito tempo se passou, e sem fundamentar a sua inferência, Clemente de Alexandria (II-III d.C.,) aponta Epimênides como o cretense que afirmou que os cretenses eram mentirosos, o que Girólamo posteriormente também afirmou[21].

Como é impossível determinar quem o apóstolo Paulo citou, e o contexto da qual a frase foi extraída, nos resta debruça somente sobre o que foi dito a Tito, sendo certo afirmar que, um certo cretense disse acerca do seu próprio povo que eles eram mentirosos.

Calímaco, pelo fato de os cretenses terem edificado um túmulo a Zeus, falou abertamente que ‘os cretenses são sempre mentirosos’, Hesíodo, por sua vez, muito antes e de modo velado, contrapõe a sua condição com a dos deuses gregos, ao registrar a fala das Musas: ‘Pastores agrestes, vis infâmias e ventres só’, evidenciando assim a sua condição vil.

No texto de Hesíodo, os tradutores vertem κακὰ θηρία por ‘bestas ruis’, sendo que o termo θηρία[22], também pode descrever as características que tornam os animais inferiores, desse modo, também pode denotar um indivíduo de origem vil, da ralé, ou seja, bruto (Provérbio 30.2).

Verter ‘ventre só’ por ‘ventre preguiçoso’ é temerário, pois a ideia de ventre, na maioria das vezes, aponta para o próprio indivíduo. Como alguém que foi apontado pelas Musas como pastor agreste pode ser tido por preguiçoso? Não seria o contrário, alguém que só vive para trabalhar? ‘Vente só’ diz de alguém que está a serviço somente do seu próprio estomago para se alimentar. Enquanto um nobre tem a possibilidade de expandir os seus horizontes, alguém de classe baixa só pensa no que a terra pode produzir, é um escravo do próprio ventre.

Jesus ensinou que é impossível servir a dois senhores, porque se ama um e odeia o outro, e arremata: não podeis servir a Deus e as riquezas (Mateus 6.24). Quem quiser servir a Deus não pode estar a serviço de si mesmo, ou seja, servindo as riquezas!

“Porque os tais não servem a nosso Senhor Jesus Cristo, mas ao seu ventre; e com suaves palavras e lisonjas enganam os corações dos simples.” (Romanos 16.18);

“Cujo fim é a perdição; cujo deus é o ventre, e cuja glória é para confusão deles, que só pensam nas coisas terrenas.” (Filipenses 3.19).

Ao nomear um cretense como profeta, isto não significa que o apóstolo estava apresentando esse grego em específico como alguém que falou inspirado por Deus, vez que, é dito ‘um profeta deles’, e não ‘um profeta de Deus’. O termo προφητης (prophetes) entre os gregos era utilizado para se referir aos poetas, por eles acreditarem que cantavam sob inspiração das divindades, ou por entenderem que interpretavam oráculos ou mensagens ocultas.

Mas, qual a base do apóstolo Paulo ao afirmar que era verdadeiro o que foi dito por um cretense, se o que foi dito: ‘os cretenses são sempre mentirosos’, provem de alguém que pertence ao conjunto dos mentirosos? Se o profeta cretense faz parte de um grupo de pessoas que mentem, como é possível afirmar que nesse quesito especifico esse mentiroso disse a verdade?

Estudiosos que se ocupam com o campo da lógica se deslumbram com esse aparente paradoxo que surge através do testemunho do apóstolo dos gentios: ‘Este testemunho é verdadeiro’ (Tito 1.13). Mas, quando disse que o testemunho do profeta cretense era verdadeiro, o apóstolo Paulo tinha em vista o testemunho das Escrituras, que diz:

“Dizia na minha pressa: Todos os homens são mentirosos.” (Salmos 116.11).

O testemunho das Escrituras é verdadeiro porque Davi escreveu esse Salmo na qualidade de profeta (Atos 2.30), ou seja, é Deus que, por intermédio de Davi, assinala que todos os homens são mentirosos. Mas, o pior é quando alguém se diz interprete[23] das Escrituras, e polemiza o texto sagrado como fazem muitos filósofos, historiadores, matemáticos, etc., o que deveria ser próprio somente aos opositores das Escrituras[24].

O Salmo 116 é messiânico, pois profetiza acerca das aflições, morte e ressurreição de Cristo. De Cristo é dito que andou na terra dos viventes após ter a alma livre da morte, de modo que o testemunho: ‘todos os homens são mentirosos’ não é de Davi, e sim, de Deus:

“Porque tu livraste a minha alma da morte, os meus olhos das lágrimas, e os meus pés da queda. Andarei perante a face do SENHOR na terra dos viventes.” (Salmo 116.8-9).

Como os cretenses são homens, certo é que eles também estavam inclusos no rol de homens apontado pelo salmista. Nesse sentido, o apóstolo afirma que Deus sempre é verdadeiro, contrapondo a essência divina com a dos homens: mentirosos, e cita as Escrituras para comprovar o que foi dito:

“De maneira nenhuma; sempre seja Deus verdadeiro, e todo o homem mentiroso; como está escrito: Para que sejas justificado em tuas palavras, e venças quando fores julgado.” (Romanos 3.4).

Vale destacar que o testemunho das Escrituras que enfatizam que todos os homens são mentirosos tinha em vista conscientizar os filhos de Israel da sua real condição diante de Deus, vez que achavam que eram melhores que os gentios. Por que os filhos de Israel eram mentirosos? Porque, de fato, não eram filhos de Deus.

“Porque este é um povo rebelde, filhos mentirosos, filhos que não querem ouvir a lei do SENHOR.” (Isaías 30.9);

“Corromperam-se contra ele; não são seus filhos, mas a sua mancha; geração perversa e distorcida é.” (Deuteronômio 32.5).

A condição de mentirosos pertinente aos filhos de Israel era decorrente de berço, e não de caráter ou moral. Se fossem filhos de Deus seriam verdadeiros, mas como não eram filhos, não passavam de uma mancha.

Enquanto a visão do homem de hoje pensa a frase citada pelo apóstolo Paulo: ‘Os cretenses são sempre mentirosos’, como algo relacionado ao luxo, maus costumes, materialismo vulgar, preguiça, luxuria, usura, etc., vê-se na história que os cidadãos de Creta do período clássico eram homens instruídos na arte da guerra[25], tinham leis que estabeleciam classes sociais[26] e gozavam de prestigio político[27]. Ademais, não há evidencias de que a citação feita pelo apóstolo Paulo descrevesse o comportamento e o caráter dos cretenses sob domínio romano.

Na obra ‘Trabalhos e Dias’, Hesíodo narra o surgimento da linhagem dos homens mortais descendente dos imortais:

De ouro a primeiríssima linhagem de homens mortais foi feita pelos imortais que têm casas olímpias. Existiram na época de Crono, quando reinava no céu: como deuses viviam com ânimo e sem aflição, afastados do labor, longe da agonia. Nem a infeliz velhice havia, e, sempre iguais nos pés e mãos, apraziam-se em festejos, além de todos os males; morriam como por sono subjugados. Toda benesse possuíam: o fruto, que produzia o solo dá-trigo, espontâneo, era farto e sem inveja; de bom grado, tranquilos gozavam dos grãos com muita benesse, ricos em ovelhas, caros aos deuses ditosos.” Hesíodo, Trabalhos e Dias.

Hesíodo demonstra que somente os homens que descenderam diretamente dos imortais eram reais (bem-nascidos), diferente dos demais homens que não pertenciam a linhagem de ouro, portanto, mentirosos (malnascidos), visto que a primeira linhagem foi feita de ouro pelos imortais, que residem em casas olímpias. Esses homens bem-nascidos não eram sujeitos ao labor e gozavam de alta estima dos deuses.

As Musas, por sua vez, ao designar Hesíodo como ‘pastor agreste’, nega-lhe ascendência áurea, e atrela uma condição negativa ao poeta designando-lhe a profissão[28].

Jaeger, analisando os poemas de Teógnis, fez a seguinte observação:

“O poeta aconselha a que se evite o trato com os maus (kakoi), em que o poeta engloba todos os que não pertencem a uma estirpe nobre; por outro lado, também, nobres (agathos) só se acham entre seus iguais” (Jaeger, Paideia, 244).

Friedrich Nietzsche, por sua vez, ao falar de Teógnis, esclarece:

“Eles se denominam, por exemplo, ‘os vorazes’; primeiramente a nobreza grega, cujo porta-voz é o poeta Teógnis de Megara. A palavra cunhada para este fim, αγαθός [bom, nobre], significa, segundo sua raiz, alguém que é, que tem realidade, que é real, verdadeiro; depois, numa mudança subjetiva, significa o verdadeiro enquanto veraz: nesta fase da transformação conceitual ela se torna lema e distintivo da nobreza, e assume inteiramente o sentido de ‘nobre’, para diferenciação perante o homem comum mentiroso, tal como Teógnis o vê e descreve – até que finalmente, com o declínio da nobreza, a palavra resta para designar a aristocracia espiritual, tornando-se como que doce e madura” Nietzsche, Friedrich, Genealogia da moral: uma polemica; tradução, notas e posfácio Paulo César de Souza – São Paulo: Companhia das Letras, 2009, pág. 19.

Como é impossível precisar quem é o autor da frase: “κρητες αει ψευσται κακα θηρια γαστερες αργαι” Scrivener’s Textus Receptus (1894), e o contexto da qual foi extraída pelo apóstolo dos gentios, e considerando o que foi posto pelo salmista: ‘Todos os homens são mentirosos’, o que indubitavelmente levou o apóstolo a afirmar que é verdadeira a frase ‘os cretenses são mentirosos’, todos esses elementos faz com que nos afastemos da concepção que levará a uma falácia lógica, e nos aproximemos da ideia que aborda a questão como sendo uma forma de referência à condição dos cretenses que, como homens, estão aquém dos deuses.

Se tomarmos como base o texto de Calímaco, certo é que a frase: ‘os cretenses são sempre mentirosos’, se deve a uma questão religiosa, pois o pensamento cretense acerca dos deuses contrapunha o pensamento dos demais gregos. Mas, se considerarmos o texto de Hesíodo, que consta ‘vis infâmias e ventres só’, verifica-se que estamos diante de um contexto que apresenta o homem em contraste com a divindade, como sendo vil, ralé, baixo.

Creta, através da civilização minoica (c. 2700 – 1 420 a.C.) era o centro da civilização europeia, e na sua cultura primitiva haviam diversas lendas, como a do rei Minos, Teseu e o Minotauro, oralmente passada as futuras civilizações.  Após a erupção do Tera, que dizimou os minoicos, eles foram conquistados pelos micênios (1 420 a.C.). No período clássico e helenístico, Creta era dominada por cidades-estados em constante estado de guerra, e acabou por ser dominada por Roma.

Tanto o apóstolo Paulo quanto Tito conheciam a história de Creta, e não escapava a ambos o fato de que os cretenses faziam uma releitura dos mitos, o que influenciava diretamente a religião e a política.  Para Tito, um grego, era patente a capacidade dos cretenses em fazer uso de uma referência mitológica e, por meio dela, construir um novo mito, reinterpretando-o.

No mundo existem diversas interpretações de uma lei, existem diversas possibilidades de releituras de uma obra literária, etc., e os cretenses, com as suas releituras dos mitos, ao longo do tempo criavam polêmica com os costumes, infundiam novas práticas religiosas que contrapunham as crenças religiosas mais difundidas entre os gregos, bem com as tradicionais doutrinas cosmológicas e astrológicas mais comuns eram postas em xeque, o que lhes rendeu uma fama entre os gregos.

Tito também sabia que não cabe aos cristãos julgarem os não cristãos por suas práticas, costumes, caráter ou moral, de modo que ele compreendeu o que o apóstolo dos gentios evocou ao citar o que dissera um dos profetas cretenses: ‘Os cretenses são sempre mentirosos’.

“Porque, que tenho eu em julgar também os que estão de fora? Não julgais vós os que estão dentro?” (1 Coríntios 5.12).

Com a citação, o apóstolo Paulo chama a atenção de Tito para uma espécie de tendência dos cretenses em interpretar e redesenhar licenciosamente os seus mitos e, em seguida, conclui utilizando o substantivo[29] αἰτίαν, que era necessário repreende-los[30] (por meio de evidencias, exposição) severamente, para que fossem sãos na fé.

Tito deveria ser grave na repreensão demonstrando que, com relação ao evangelho (fé), os cretenses não gozavam de liberdade para fazer releituras, interpretações várias, etc., antes deviam se ater ao que fora ensinado, para serem sãos[31] no evangelho. Percebe-se pelo contexto, que a citação do poeta cretense visou única e exclusivamente destacar a seguinte ordem a Tito: Portanto, repreende-os severamente, para que sejam sãos na fé’, e não recriminar a moral ou o comportamento dos habitantes de Creta.

O risco das fábulas judaicas e dos mandamentos de homens

“Não dando ouvidos às fábulas judaicas, nem aos mandamentos de homens que se desviam da verdade. Todas as coisas são puras para os puros, mas nada é puro para os contaminados e infiéis; antes o seu entendimento e consciência estão contaminados. Confessam que conhecem a Deus, mas negam-no com as obras, sendo abomináveis, e desobedientes, e reprovados para toda a boa obra.” (Tito 1.14-16).

Os cristãos de Creta, para permanecerem firmes e sãos no evangelho, não podiam dar ouvidos às fábulas judaicas.

“Porque não vos fizemos saber a virtude e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, seguindo fábulas artificialmente compostas; mas nós mesmos vimos a sua majestade.” (2 Pedro 1.16).

O que seriam essas fábulas? São pequenas estórias cujos personagens são animais envolvidos em situações cotidianas que transmitem lições e ensinamentos de cunho moralizante. Essas narrativas fictícias e alegóricas quando utilizadas para transmitir princípios morais e boas práticas para convencia em sociedade não são problemas.  O problema é querer ensinar o evangelho por meio de tais artifícios.

Utilizar fábulas para tentar ensinar a mensagem de Cristo aos povos já é pernicioso, quanto mais fazer uso de fábulas judaicas. As estórias judaicas aparentemente inocentes, invariavelmente de cunho moralizante, infundem ideias que impedirá o homem de compreender a essência das Escrituras.

A moral da fábula invariavelmente estará eivada de elementos que remeterá a mandamentos de homens, o que contraria a essência do mandamento de Deus. De longa data Deus protesta contra o povo de Israel que não se sujeitavam a Sua palavra, antes seguiam o desvairo de seus próprios pensamentos.

“Porque o Senhor disse: Pois que este povo se aproxima de mim, e com a sua boca, e com os seus lábios me honra, mas o seu coração se afasta para longe de mim e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, em que foi instruído;” (Isaías 29.13);

“Mas não ouviram, nem inclinaram os seus ouvidos, antes andaram cada um conforme o propósito do seu coração malvado; por isso trouxe sobre eles todas as palavras desta aliança que lhes mandei que cumprissem, porém não cumpriram.” (Jeremias 11.8).

Um religioso do judaísmo comporá uma parábola que espelha o mandamento de Deus, ou fará uma fábula que refletirá o propósito do seu coração enganoso? Como a boca fala do que o coração está cheio, certo é que fará fábulas segundo o propósito do seu coração malvado.

“Raça de víboras, como podeis vós dizer boas coisas, sendo maus? Pois do que há em abundância no coração, disso fala a boca.” (Mateus 12.34).

As fábulas judaicas serão utilizadas como iscas, e, invariavelmente, o ouvinte incauto será posto em contato com elementos do culto judaico, como: sábados, jejuns, dias, luas, festas, etc., distanciando o ouvinte da verdade do evangelho.

Os cristãos de Creta deveriam ter bispos que os ensinassem a não dar ouvidos as estórias judaicas e nem se deixarem enganar com mandamentos de homens, tais como: não toques, não proves, não manuseies (Colossenses 2.21), uma vez que esses homens apostataram do evangelho (fé).

Qual não é a surpresa em nossos dias, se não uma crescente inundação dos templos evangélicos/protestantes de elementos do culto judaico, como: kipá, tzitzit, peiot, estrela de Davi, arca da aliança, etc. Nesse diapasão, vê-se nos livros de teologia ditos cristãos diversas referências a pensamentos de rabinos, sacerdotes, etc., utilizados para se fazer interpretação e conclusões acerca das Escrituras.

Fazer uso de escritos judaicos para ler as Escrituras é não levar em conta o alerta:

“Por isso me indignei contra esta geração, E disse: Estes sempre erram em seu coração, E não conheceram os meus caminhos.” (Hebreus 3.10).

Deixar guiar-se pelo judaísmo é deixar ser guiado por condutores cegos:

“Deixai-os; são condutores cegos. Ora, se um cego guiar outro cego, ambos cairão na cova.” (Mateus 15.14).

Para o judaísmo há diversas coisas impuras, e muitas que necessitam de purificação, inclusive os religiosos precisam se purificar constantemente através de rituais. O cristão, por sua vez, é declarado ‘puro’, e o termo grego utilizado para qualificar o cristão é καθαρός (katharos).

É o mesmo termo utilizado por Cristo ao declarar os seus discípulos que estavam limpos pela Sua palavra:

“Vós já estais limpos, pela palavra que vos tenho falado.” (João 15.3).

Para os cristãos tudo é puro, de modo que não vive segundo regras de homens que se resumem em não toques, não proves, não manuseies (Colossenses 2.21), mas para os contaminados (μιαινω/miaino) e infiéis (απιστεω/apisteo), nada é puro.

O apóstolo Pedro durante a transformação do seu entendimento considerava os gentios imundos, mas após a visão na qual Deus ordenava matar e comer animais que considerava impuro, o apóstolo da circuncisão chegou à seguinte conclusão: Deus não faz acepção de pessoas (Atos 10.34).

“Mas a voz respondeu-me do céu segunda vez: Não chames tu comum ao que Deus purificou.” (Atos 11.9).

Durante esse período da Covid-19, se você vai a um templo e há pia, água e sabão para higienização das mãos, não há problema algum, mas se for fornecido água a pretexto de purificação, quem está na direção daquele ajuntamento de pessoas tem o entendimento e a consciência contaminados.

O apóstolo Paulo diz com todas as letras que a religião que antes seguia era composta de manchados e infiéis, e tanto a consciência quanto o entendimento estavam contaminados. Causa estranheza que essa declaração do apóstolo dos gentios não suscite questionamentos tanto quanto a citação acerca dos cretenses.

Dizer que os judaizantes eram faltos de entendimento ou que tinham a consciência contaminada era fruto de um julgamento do apóstolo Paulo? Não! Ele não podia fazer esse julgamento, senão pelas Escrituras:

“Porque são gente falta de conselhos, e neles não há entendimento.” (Deuteronômio 32.28).

“Porque lhes dou testemunho de que têm zelo de Deus, mas não com entendimento.” (Romanos 10.2).

Embora os que seguem o judaísmo digam abertamente que compreendem[32] a palavra de Deus, as obras deles negam a Deus, ou seja, não obedecem a Deus. As obras dos filhos de Israel dizem que ‘não há Deus’:

DISSE o néscio no seu coração: Não há Deus. Têm-se corrompido, e cometido abominável iniquidade; não há ninguém que faça o bem.” (Salmos 53.1).

O Salmo 53 é repreensão em desfavor dos filhos de Israel e dos seus líderes, pois o povo de Israel é que cometeram abominável iniquidade:

“Acaso não têm conhecimento os que praticam a iniquidade, os quais comem o meu povo como se comessem pão? Eles não invocaram a Deus.” (Salmos 53.1);

“Porque Jerusalém está arruinada, e Judá caída; porque a sua língua e as suas obras são contra o SENHOR, para provocarem os olhos da sua glória.” (Isaías 3.8).

“As suas teias não prestam para vestes nem se poderão cobrir com as suas obras; as suas obras são obras de iniquidade, e obra de violência há nas suas mãos.” (Isaías 59.6).

Quando um incauto vê a religiosidade dos judaizantes, consideram que os judeus religiosos servem a Deus, mas não atina que, apesar de serem ouvintes da palavra de Deus, não praticam.

“E eles vêm a ti, como o povo costumava vir, e se assentam diante de ti, como meu povo, e ouvem as tuas palavras, mas não as põem por obra; pois lisonjeiam com a sua boca, mas o seu coração segue a sua avareza.” (Ezequiel 33.31).

Por não se sujeitarem a Deus, o apóstolo Paulo classifica os judaizantes como abomináveis e obstinados!

“Falou-me ainda o SENHOR, dizendo: Atentei para este povo, e eis que ele é povo obstinado (…) Quando também o SENHOR vos enviou de Cades-Barnéia, dizendo: Subi, e possuí a terra, que vos tenho dado: rebeldes fostes ao mandado do SENHOR vosso Deus, e não o crestes, e não obedecestes à sua voz. Rebeldes fostes contra o SENHOR desde o dia em que vos conheci.” (Deuteronômio 9.13 e 23-24).

É por isso que o Pregador apresenta a cidade de Jerusalém como uma adultera que atrai os incautos com a sua religiosidade:

“Vi entre os simples, descobri entre os moços, um moço falto de juízo (…) E eis que uma mulher lhe saiu ao encontro com enfeites de prostituta, e astúcia de coração. Estava alvoroçada e irrequieta; não paravam em sua casa os seus pés. Foi para fora, depois pelas ruas, e ia espreitando por todos os cantos; E chegou-se para ele e o beijou. Com face impudente lhe disse: Sacrifícios pacíficos tenho comigo; hoje paguei os meus votos.” (Provérbios 7.7 e 10-14).

Alguém pode contra argumentar: – ‘Mas essa passagem fala dos filhos de Israel quando saíram do Egito’, ao que cito Jesus: “Bem testificais, pois, que consentis nas obras de vossos pais; porque eles os mataram, e vós edificais os seus sepulcros.” (Lucas 11.48).

Esse é o alerta do apóstolo João:

“Meus filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas por obra e em verdade.” (1 João 3.18).

Quem somente diz que ama a Deus, mas não O obedece, ou seja, não põe por obra, e rejeitado.

“Confessam que conhecem a Deus, mas negam-no com as obras, sendo abomináveis, e desobedientes, e reprovados para toda a boa obra.” (Tito 1.16);

“E sede cumpridores da palavra, e não somente ouvintes, enganando-vos com falsos discursos.” (Tiago 1.22);

“Porque os que ouvem a lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão de ser justificados.” (Romanos 2.13).

Mas, apesar do risco decorrente da doutrina dos judaizantes, competia a Tito falar, evidenciando a sã doutrina.

“TU, porém, fala o que convém à sã doutrina.” (Tito 1.17).

[1] “4245 πρεσβυτε ρος presbuteros comparativo de presbus (de idade avançada); TDNT – 6:651,931; adj 1) ancião, de idade, 1a) líder de dois povos 1b) avançado na vida, ancião, sênior 1b1) antepassado 2) designativo de posto ou ofício 2a) entre os judeus 2a1) membros do grande concílio ou sinédrio (porque nos tempos antigos os líderes do povo, juízes, etc., eram selecionados dentre os anciãos) n2a2) daqueles que em diferentes cidades gerenciavam os negócios públicos e administravam a justiça 2b) entre os cristãos, aqueles que presidiam as assembleias (ou igrejas). O NT usa o termo bispo, ancião e presbítero de modo permutável 2c) os vinte e quatro membros do Sinédrio ou corte celestial assentados em tronos ao redor do trono de Deus Dicionário Bíblico Strong.

[2] “4246 πρεσβυτης presbutes do mesmo que 4245; TDNT – 6:683,931; n m 1) homem velho, idoso 2) embaixador” Dicionário Bíblico Strong.

[3] “4103 πιστ ος pistos de 3982; TDNT – 6:174,849; adj 1) verdadeiro, fiel 1a) de pessoas que mostram-se fiéis na transação de negócios, na execução de comandos, ou no desempenho de obrigações oficiais 1b) alguém que manteve a fé com a qual se comprometeu, digno de confiança 1c) aquilo que em que se pode confiar 2) persuadido facilmente 2a) que crê, que confia 2b) no NT, alguém que confia nas promessas de Deus 2b1) alguém que está convencido de que Jesus ressuscitou dos mortos 2b2) alguém que se convenceu de que Jesus é o Messias e autor da salvação” Dicionário Bíblico Strong.

[4] “1985 επισκοπ ος episkopos de 1909 e 4649 (no sentido de 1983); TDNT – 2:608,244; n m 1) supervisor 1a) pessoa encarregada de verificar se aqueles sob a sua supervisão está fazendo corretamente o que têm que fazer, curador, guardião ou superintendente 1b) superintendente, líder, ou supervisor de um igreja cristã” Dicionário Bíblico Strong.

[5] “3621 οικονομεω oikonomeo de 3623; v 1) ser um administrador 2) administrar os afazeres de um lar 3) administrar, ministrar, ordenar, regular” Dicionário Bíblico Strong.

[6] “3182 μεθυσκω methusko forma prolongada (transitiva) de 3184; TDNT – 4:545,*; v 1) intoxicar, embebedar 2) ficar bêbado, ficar intoxicado” Dicionário Bíblico Strong.

[7] “810 ασωτια asotia de um composto de 1 (como partícula negativa) e um suposto derivado de 4982; TDNT – 1:506,87 1) vida dissoluta, descontrolada 2) desperdício, prodigalidade” Dicionário Bíblico Strong.

[8] “3631 οινος oinos palavra primária (ou talvez de origem hebraica 3196); TDNT – 5:162,680; n m 1) vinho 2) metáf. vinho abrasador da ira de Deus Dicionário Bíblico Strong.

[9] “5382 φιλοξεν ος philoxenos de 5384 e 3581; TDNT – 5:1,661; adj 1) hospitaleiro, generoso para as visitas” Dicionário Bíblico Strong.

[10] “Amor (gr. agape) (1 Pe 4.8; Rm 5.5, 8; 1 Jo 3.1; 4.7, 8,16; Jd 21) Esta palavra raramente era usada na literatura grega, antes do Novo Testamento. E quando isso acontecia, ela era usada para expressar um ato de gentileza aos estrangeiros, de oferecer hospitalidade e ser caridoso”. O Novo Comentário Bíblico NT, com recursos adicionais — A Palavra de Deus ao Alcance de Todos, Editores Earl Radmacher, Ronald B. Allen e H. Wayne House, Rio de Janeiro, 2010, pág. 701.

[11] “4998 σωφρων sophron da raiz de 4982 e de 5424; TDNT – 7:1097,1150; adj 1) de mente sã, equilibrado 2) que freia os próprios desejos e impulsos, autocontrolado, moderado” Dicionário bíblico Strong.

[12] “1342 δικαιος dikaios de 1349; TDNT – 2:182,168; adj 1) justo, que observa as leis divinas 1a) num sentido amplo, reto, justo, virtuoso, que guarda os mandamentos de Deus 1a1) daqueles que se consideram justos, que se orgulham de serem justos, que se orgulham de suas virtudes, sejam reais ou imaginárias 1a2) inocente, irrepreensível, sem culpa 1a3) usado para aquele cujo o modo de pensar, sentir e agir é inteiramente conforme a vontade de Deus, e quem por esta razão não necessita de retificação no coração ou na vida 1a3a) na verdade, apenas Cristo 1a4) aprovado ou aceitado por Deus 1b) num sentido mais restrito, dar a cada um o que merece e isto em um sentido judicial; emitir um juízo justo em relação aos outros, seja expresso em palavras ou mostrado pelo modo de tratar com ele” Dicionário bíblico Strong.

[13] “3741 οσιος hosios de afinidade incerta; TDNT – 5:489,734; adj 1) purificado de pecado, livre de iniquidade, observando religiosamente cada obrigação moral, santo, puro, piedoso Sinônimos ver verbete 5878” Dicionário bíblico Strong.

[14] “1468 εγκρατης egkrates de 1722 e 2904; TDNT – 2:339,196; adj 1) forte, robusto 2) que tem poder sobre, possuído de (algo) 3) que domina, controla, modera, restringe 3a) que se controla, temperado, continente” Dicionário bíblico Strong.

[15] “472 αντ εχ ομαι antechomai de 473 e a voz média de 2192; TDNT – 2:827,286; v 1) manter, reter, tolerar, resistir 2) opor-se frontalmente a; apegar-se com firmeza; unir-se a alguém ou algo, prestando cuidadosa atenção ao mesmo” Dicionário bíblico Strong.

[16] “1322 διδαχη didache de 1321; TDNT – 2:163,161; n f 1) ensino 1a) aquilo que é ensinado 1b) doutrina, ensino a respeito de algo 2) o ato de ensinar, instrução 2a) nas assembleias religiosas dos cristãos, fazer uso do discurso como meio de ensinar, em distinção de outros modos de falar em público” Dicionário bíblico Strong.

[17] “1415 δυνατος dunatos de 1410; TDNT – 2:284,186; adj 1) capaz, forte, poderoso, potente 1a) poderoso em riqueza e influência 1b) forte na alma 1b1) suportar calamidades e sofrimentos com coragem e paciência 1b2) firme nas virtudes cristãs 2) ser capaz (de fazer algo) 2a) poderoso, que se sobressai em algo 2b) ter poder para algo” Dicionário bíblico Strong.

[18] “506 ανυποτακτος anupotaktos de 1 (como uma partícula negativa) e um suposto derivado de 5293; TDNT – 8:47,1156; adj 1) não submisso 2) que não pode se sujeitado ao controle, desobediente, insubordinado, teimoso” Dicionário bíblico Strong.

[19] “3151 ματαιολογος mataiologos de 3152 e 3004; TDNT – 4:524,571; n m 1) papudo, conversador, alguém que fala coisas vazias e sem sentido” Dicionário bíblico Strong.

[20] “5423 φρεναπατης phrenapates de 5424 e 539; n m 1) impostor, sedutor” Dicionário bíblico Strong.

[21] CASERTANO, Giovanni, Epimênides: sábio ou filósofo? Pág. 30-31 < http://www.hypnos.org.br/revista/index.php/hypnos/article/download/222/223 > Consultado em 18/03/2020.

[22] “2342 θηριον therion diminutivo do mesmo que 2339; TDNT – 3:133,333; n n 1) animal 2) animal selvagem, besta selvagem, besta 3) metáf. um ser bruto, lascivo, selvagem, feroz Sinônimos ver verbete 5846 e 5930”, e; “5930 – Animal. Ver definição de ζωον 2226 Ver definição de θηριον 2342 ζωον é um termo geral, que significa criatura viva. Pode incluir todos os seres viventes. No grego clássico, incluía os seres humanos. No N.T., significa de forma geral animal. θηριον é besta, geralmente feras selvagens. Implica talvez não necessariamente em selvajaria e ferocidade, mas pelo menos uma certa dose de brutalidade, ausente em ζωον. ζωον enfatiza as qualidades pelas quais animais são semelhantes ao homem, θηριον, aquelas que as tornam inferiores.” Dicionário bíblico Strong.

[23] “Dizia na minha pressa: ‘Todo homem é um mentiroso!’ David está dizendo a verdade ou ele está mentindo? Se é verdade que todo homem é um mentiroso, e a declaração de David, “Todo homem é um mentiroso”, é verdadeira, então David também está mentindo; ele também é um homem. Mas se ele também está mentindo, a sua declaração “Todo homem é um mentiroso” consequentemente é falsa. Independentemente da ordem da proposição, a conclusão é uma contradição. Uma vez que David é um homem, segue-se que ele também está mentindo; mas se ele está mentindo porque todo homem é um mentiroso, sua mentira é de um tipo diferente.” St. Jerome, Homily on Psalm 115 (116B), translated by Sr. Marie Liguori Ewald, IHM, in The Homilies of Saint Jerome, Volume I (1-59 On the Psalms), The Fathers of the Church 48 (Washington, D.C.: The Catholic University of America Press, 1964), 294 apud Wikipédia < https://pt.wikipedia.org/wiki/Paradoxo_do_mentiroso#cite_note-3 > Consulta realizada em 22/03/20.

[24] “O escritor Paulo, pelo menos nesta ocasião, não teve a Orientação Divina, já que não percebeu a sutiliza” Saifullah, M. S. M. (1999), “Epimenides’ Paradox: Was Paul Inspired?,” Islamic Awareness apud Os apóstolos Paulo e Tito, Epimênides e a ilha de Creta, Blog Paracleto < https://institutoparacleto.org/2014/02/04/os-apostolos-paulo-e-tito-epimenides-e-a-ilha-de-creta/ > Consulta realizada em 22/03/20.

[25] “Na Lacedemônia e em Creta, a quase totalidade de sua disciplina e de suas numerosas regras é dirigida para a guerra.” ARISTÓTELES, A Política.

[26] “Esta necessidade de dividir o Estado em classes diversas, segundo a variedade das funções, e de separar os homens de guerra dos lavradores não é uma invenção de hoje, nem um segredo recém-descoberto pelos filósofos que se ocupam de política. Tal distinção foi introduzida no Egito pelas leis de Sesóstris e em Creta pelas de Minos.” ARISTÓTELES, A Política.

[27] “Eis o que tinha a dizer das três Repúblicas, Lacedemônia, Creta e Cartago, que gozaram de tão justa e tão universal reputação.” ARISTÓTELES, A Política.

[28] “Na Grécia antiga, o trabalho recebia conotações negativas e era considerado impróprio para homens livres. (…) A profissão de alguém não era um meio importante para a autoidentificação, como é nas sociedades modernas”. KOSMOPOULOU, A. ‘Working Women’: female professionals on classical Attic gravestones. The Annual of the British Schools at Athens, vol. 96, p. 281-319, 2001 apud VASCONCELLOS AMARAL, FLÁVIA, Brindai enquanto podeis! O simpósio nos epigramas fúnebres do Livro VII da Antologia Grega, VERSÃO CORRIGIDA, São Paulo, 2018. < https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8143/tde-13032019-102855/publico/2018_FlaviaVasconcellosAmaral_VCorr2.pdf > Consulta realizada em 21/03/20.

[29] “156 αιτια aitia do mesmo que 154; n f 1) causa, razão 2) motivo por que alguém merece punição, crime 3) indiciação, acusação Sinônimos ver verbete 5884” Dicionário bíblico Strong.

[30]1651 ελεγχω elegcho de afinidade incerta; TDNT – 2:473,221; v 1) sentenciar, refutar, confutar 1a) geralmente com implicação de vergonha em relação à pessoa sentenciada 1b) por meio de evidências condenatórias, trazer à luz, expor 2) achar falta em, corrigir 2a) pela palavra 2a1) repreender severamente, ralhar, admoestar, reprovar 2a2) exigir prestação de contas, mostrar para alguém sua falta, exigir uma explicação 2b) pela ação 2b1) castigar, punir Sinônimos ver verbete 5884” Dicionário bíblico Strong.

[31] “5198 υγι αινω hugiaino de 5199; TDNT – 8:308,1202; v 1) estar são, estar bem, estar com boa saúde 2) metáf. 2a) de cristãos cujas opiniões estão livres de qualquer contaminação de erro 2b) de alguém que mantém favor e é forte” Dicionário bíblico Strong.

[32] “1492 ειδω eido ou οιδα oida palavra raiz; TDNT – 5:116, 673; v 1) ver 1a) perceber com os olhos 1b) perceber por algum dos sentidos 1c) perceber, notar, discernir, descobrir 1d) ver 1d1) i.e. voltar os olhos, a mente, a atenção a algo 1d2) prestar atenção, observar 1d3) tratar algo 1d3a) i.e. determinar o que deve ser feito a respeito de 1d4) inspecionar, examinar 1d5) olhar para, ver 1e) experimentar algum estado ou condição 1f) ver i.e. ter uma entrevista com, visitar 2) conhecer 2a) saber a respeito de tudo 2b) saber, i.e. adquirir conhecimento de, entender, perceber 2b1) a respeito de qualquer fato 2b2) a força e significado de algo que tem sentido definido 2b3) saber como, ter a habilidade de 2c) ter consideração por alguém, estimar, prestar atenção a (1Ts 5.12) Sinônimos ver verbete 5825” Dicionário bíblico Strong.

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